A estrela do cinema francês Alain Delon, que morreu no domingo aos 88 anos, disse que ele era como uma divindade no Japão.

Não foi um exagero, disseram fãs locais à France-Presse (AFP) na segunda-feira.

“No Japão sou uma espécie de deus”, disse Delon à Le Figaro Magazine em 1986, numa das suas muitas visitas ao país do sol nascente, quando as mulheres desmaiavam e multidões perseguiram a sua limusina.

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“As pessoas sentem verdadeiro prazer em tocar-me, acariciar a minha mão, beijar os meus dedos”, dizia o ator à revista, relatando que fãs o encheram de presentes, desde rosas vermelhas até estatuetas.

O filme que revelou Delon no Japão foi "À Luz do Sol" (1960), como Tom Ripley, o anti-herói bonito e homicida da adaptação ao cinema de "O Talentoso Mr. Ripley", o 'thriller' escrito por Patricia Highsmith.

Delon interpretou um “bruto ambicioso que amava dinheiro, mulheres e estava disposto a tudo”, disse Sahoko Hata, crítico de cinema que trabalhava na indústria cinematográfica japonesa na época.

“Essa sede simbolizava a da juventude japonesa da época”, destacou à AFP.

Ainda apaixonado

"À Luz do Sol"

Delon fez a primeira de muitas visitas ao Japão em 1963 para promover os seus filmes, mas também para aparecer cada vez mais em programas de variedades na televisão e em eventos sociais.

As suas aparições na TV frequentemente batiam recordes de audiência e até meados da década de 1970, o ator liderava regularmente o ranking das celebridades mais populares do Japão.

"As minhas amigas de 70 e 80 anos ainda estão loucamente apaixonadas por ele. Mesmo aos 88 anos, ele parecia ótimo", disse Seta, de 74 anos, fã de Delon, à AFP na segunda-feira.

"Costumava pensar: 'Como é possível que uma pessoa tão atraente exista neste mundo?'", disse a reformada em Tóquio.

“Ele era bonito, elegante e um pouco misterioso”, disse.

Para Kaoru Fujita, uma mulher de quase 50 anos que fazia compras em Tóquio com a filha, o nome de Delon era "sinónimo de 'homem bonito'".

“Se tivesse que pensar em alguém com quem compará-lo, diria George Clooney ou Brad Pitt”, disse à AFP.

"Mas não acho que exista alguém tão classicamente bonito quanto ele. Como ator, ele era único."

Meias e cigarros

Delon gradualmente transformou-se numa espécie de embaixador do "French chic" ["chique francês"], tornando-se o rosto da marca de moda japonesa D'Urban e aparecendo em anúncios de carros Mazda.

A marca “Alain Delon” foi lançada em 1978, voltada principalmente para o Japão e outros países asiáticos, vendendo acessórios desde relógios e meias até cigarros.

Nas décadas de 1980 e 1990, um operador turístico japonês chegou a oferecer viagens organizadas à Europa que incluíam um banquete em Paris na presença do próprio Delon.

As opções extras pagas incluíam ter a honra de presentear Delon com um bouquet ou tirar uma fotografia de recordação com ele.

Delon tinha um “lado sombrio, triste, misterioso e ambicioso, mas também um pouco perdedor”, disse à AFP Yoshi Yatabe, ex-programador do Festival Internacional de Cinema de Tóquio, em 2022.

“Esse lado negro realmente atraiu os espectadores japoneses, que tendem a gostar de perdedores. No teatro kabuki, por exemplo, o público simpatiza com os mais fracos”, disse.

"A França e a Europa eram lugares muito distantes para mim, por isso sempre me perguntava de onde ele veio", lembrou a reformada Mikiko Tsuburaya, 71 anos.

"Ainda era uma criança, não uma adulta (quando ele era popular). Olhava para ele como alguém que vivia noutro mundo”, explicou.