“A morte de Sócrates” e “A vida de John Smith” são as duas partes que compõem este díptico no qual Mickaël de Oliveira faz uma reflexão sobre o mundo atual, sobre o teatro, a política e o crescimento de fundamentalismos, disse o próprio à agência Lusa.
Neste projeto nascido em 2017 – cuja primeira parte se estreou no ano passado, no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra, e, a segunda, já este ano, no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães –, o autor do texto e da encenação pretendeu voltar a trabalhar na obra de Platão, sobretudo em “Fédon”, para analisar questões relacionadas com a morte, a dicotomia entre este mundo e o 'além', assim como o mundo físico e o mundo das ideias e das almas, acrescentou.
“Este projeto reflete também algumas das preocupações que partilho com os meus colegas de equipa; preocupações sociais, políticas, pois estamos a assistir a um mundo em transformação, com um aumento dos radicalismos, com um aumento de poder dos extremos “, referiu.
Nestas duas partes que completam o díptico, o encenador pretendeu também refletir sobre o terrorismo, expondo o nascimento de um grupo que se consolida na primeira parte do espetáculo e que, na segunda, irá mostrar suas consequências, disse.
Outro dos temas que este espetáculo analisa consiste na "ideia da morte como libertadora e também como fonte de saber", acrescentou Mickaël de Oliveira.
“A ideia de que o meu corpo morre possibilitando à minha alma ascender ao mundo das ideias e atingir novos conhecimentos” é outro dos temas em análise neste díptico, acrescentou o autor e encenador.
"A morte de Sócrates" narra os últimos três dias do filósofo na prisão, na qual permaneceu durante um mês, período em que as festas da cidade proibiam qualquer execução capital. Os amigos de Sócrates tentam convencê-lo a permanecer vivo, apresentando-lhe hipóteses de fuga. No entanto, este mantém-se convicto de que a morte é preferível à vida, já que considera o corpo um impedimento ao conhecimento puro.
Contudo, depois de alguma retórica, Paulo, Pedro, Raquel e Ana – os amigos de Sócrates - confessam que estão eles próprios convencidos de que morrer é a melhor solução, apresentando a Sócrates a utopia de um mundo livre e o plano para o atingir: a constituição de um grupo terrorista e de uma Academia que o perpetue através dos tempos.
Na segunda parte do díptico – "A vida de John Smith" – Paulo, Pedro, Raquel, Ana e Sócrates, reencarnado em John Smith, acordam de um longo sono, num Museu de História Natural.
São despertados por três membros da Academia: Aquela, Aquele e Aqueloutro que se encarregam de lhes apresentar o mundo que emergiu da utopia desenhada no 1.º episódio: uma comunidade definida pela primazia da alma em relação ao corpo.
Memória, linguagem, ficção, filiação, diferença e alteridade são os temas que alimentam a discussão na qual todos têm de chegar a uma decisão sobre o futuro deste novo mundo, em perigo perante uma ameaça sem precedentes numa homenagem a Fédon, de Platão, e ao cinema de ficção científica de série B.
“Sócrates tem de morrer” tem interpretação de Albano Jerónimo, Ana Bustorff, Maria Leite, Miguel Moreira, Paulo Pinto, Pedro Gil, Pedro Lacerda, Raquel Castro e Solange Freitas.
Tem ainda participação especial de Vanda Rodrigues e do Coro Lopes-Graça da Academia de Amadores de Música, dirigido pelo maestro José Robert.
A cenografia é de António MV e, os figurinos, de Sara Coimbra Loureiro.
A peça é uma coprodução do Colectivo 84, Centro Cultural Vila Flor, Teatro Viriato e São Luiz Teatro Municipal, e fica em cena na sala Luís Miguel Cintra, do S. Luiz, em Lisboa, até dia 9, com espetáculos de quinta-feira a sábado, às 23:00, e, ao domingo, às 19:30.
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