Escrita e encenada por Rui Neto, a peça é “uma metáfora para os dias de hoje” e surgiu da vontade de refletir sobre “a família e novos começos”, disse o encenador aos jornalistas, no final de um ensaio para a imprensa.
A altura em que começou a pensar no texto coincidiu com a vaga de refugiados que chegou a Europa, uma questão que o preocupava mas que, na altura, achou que estava “a ser quase apropriada pelos artistas”.
Por isso, acabou por pôr esse tema numa outra esfera, próxima da mitologia, levantando questões como “E se os deuses fossem obrigados a sair do local em que habitam e se refugiassem na terra”.
“E se eles próprios fossem refugiados noutro sítio o que trariam para conseguir sobreviver aqui? As próprias relações deles, mais do que isso não”, explicou.
Jane, John e Ted são os nomes das personagens-deuses – pai, mãe e filho – que a partir de 1920 vão começar a viver uma epopeia e que, em 1945, chegam como refugiados a Odivelas, num apartamento localizado por cima de um café chamado Ulisses.
A partir dessa altura, as três personagens acabam por sofrer a mesma crise de valores que o mundo à sua volta. Conflitos, frustrações, mentiras e uma traição conjugal contam-se entre as peripécias desta família numa busca eterna para resgatar a memória e, em simultâneo, construir uma identidade.
A determinada altura da peça, estas personagens vivem sob o domínio russo, o que Rui Neto explicou dever-se apenas ao facto de “o russo ser, em termos numéricos e geográficos”, a língua mais falada na Europa.
Refletir sobre a “família e os novos começos” foi a ideia de que Rui Neto partiu na altura em que escreveu o texto, acabando por socorrer-se de livros, tal como as personagens da peça o fazem, por serem estes que “dão uma pista sobre o que [se poderá] fazer”.
Sentados frente a uma suposta mesa, de costas para uma paisagem onde se vê céu e terra, Rui Neto desenrola uma trama dramatúrgica em que Jane, John e Ted acabam por viver os problemas do homem.
“Parece que há deuses à procura de uma história, mas também são deuses à procura de uma história, de uma identificação que não encontram”, porque os deuses foram inventados pelos homens pelo que terão que esperar que os homens continuem a reinventar as histórias destes, concluiu Rui Neto.
Com texto, encenação e espaço cénico de Rui Neto, “3 Gods” é interpretada por Luís Gaspar, Rodrigo Tomás e São José Correia. O desenho de luz é de João Rafael Silva, a sonoplastia de Cristóvão Campos e a cenografia em ferro de Rui Miragaia.
A peça tem animação em vídeo da Temper Creative Agency e apoio à língua russa – já que tem parte falada em russo – por Anna Eremim.
Produzida pelo Teatro da Trindade/Inatel e pela Lobo Mau produções, a peça estará em cena na sala Estúdio até 16 de junho, com espetáculos de quarta a sábado, às 21:30, e, ao domingo, às 17:00.
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