O diretor artístico da Casa da Música, António Jorge Pacheco, explicou aos jornalistas que o festival, que todos os anos decorre naquela instituição próximo do 25 de Abril, se concentra pela primeira vez só num compositor.
A escolha recaiu sobre Webern pela Casa atravessar o Ano Áustria, linha mestra da programação, mas também pelo caráter de destaque de um criador “revolucionário, em relação ao qual se pode dizer que há um antes e depois”.
O diretor apontou o impacto do austríaco, um dos pilares da Segunda Escola de Viena (com Arnold Schoenberg e Alban Berg), na chamada Escola de Darmstadt, da qual se destacam os compositores Karlheinz Stockhausen, Pierre Boulez e Bruno Maderna, uma geração “profundamente marcada por esta figura ímpar da música”.
O Música & Revolução é “um dos festivais mais antigos e emblemáticos da Casa da Música, e um dos momentos mais desafiantes da programação”, considerou António Jorge Pacheco.
Partindo da música de José Afonso, na primeira edição, o ciclo já atravessou vários temas relacionados com a revolução, do Maio de 68 às músicas banidas pelo regime Nazi, na Alemanha, ou pela União Soviética.
Desta feita, a proposta centra-se inteiramente na obra de um único criador, com quatro concertos dos vários agrupamentos residentes a atravessarem “cerca de 90% da produção musical” de Webern, da juventude à fase mais madura.
“É como propor ao público ir a um museu e ver uma exposição dedicada a um só artista, tomando contacto com toda a obra e produção desse artista”, acrescentou.
O compositor austríaco é sujeito a um momento abrangente que propõe ao público “imersão total” na obra, num “’statement’ internacional” que a sala projeta.
“Já foi feito em Viena, há mais de uma década, um festival inteiramente dedicado a Webern, mas jamais foi feito um tão abrangente, percorrendo todo o seu percurso criativo”, acrescentou.
Sobre o compositor, António Jorge Pacheco descreve-o como “alguém que, sendo revolucionário, respeitava a grande tradição germânica”.
“Era como se pegasse num grande bloco de pedra, sendo este a tradição germânica, e começasse a esculpi-la, até ficar reduzida à essência”, comentou.
Webern define-se, assim, por uma “música muito concisa, escrita com muito poucas notas com as quais consegue expressividade máxima”, criando uma “linguagem extremamente depurada”.
Para os intérpretes, o estilo “exige uma precisão rítmica e tímbrica dos músicos que a tornam particularmente difícil de interpretar”, dando ao público um impacto “musicalmente rarefeito no som, que lida tanto com o silêncio”.
Na sexta-feira, pelas 21:00, o Remix Ensemble e o Coro Casa da Música juntam-se à soprano ucraniana Christina Daletska para interpretar Concerto op. 24, para vários instrumentos, Sinfonia op.21, Duas canções op.19, sobre Goethe, e a primeira Cantata op.29, sobre texto da poetiza Hildegard Jone, culminando um conjunto de obras tardias de Webern, escritas durante a II Guerra Mundial e sob o domínio nazi.
Na segunda parte do concerto, o Coro e Daletska alinham com o barítono britânico Ivan Ludlow e a Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música para a segunda cantata, já depois de “Seis peças para orquestra op.6”, sobre episódios ligados à morte da mãe, e “Das Augenlicht, op.26” ("A visão"), para coro e orquestra, esta última de novo em colaboração com Hildegard Jone.
Os mesmos agrupamentos atravessam, no sábado, uma série de outras obras do autor, com destaque para o famoso opus 1, a “Passacaglia” ainda de raiz romântica, precedida de “Im Sommerwind” ("Sob a brisa de verão"), um "idílio para orquestra" composto nos primeiros anos, antes da sua associação a Arnold Schoenberg, obra descoberta após a morte de Webern, estreada pela Orquestra de Filadélfia, em 1962.
No domingo, o Quarteto Arditti, de Irvine Arditti, aborda as obras para conjuntos de câmara, as Cinco peças, op.5, o "Langsamer Satz" ("Movimento lento") para quarteto de cordas, as Bagatelas, op.9, além do Trio, op.20, e do Quarteto, op.28.
O festival termina a 29 de abril, com o Coro Casa da Música, dirigido por Paul Hillier, a explorar vários motetes de Heinrich Isaac intercalados com música sacra do estónio Arvo Pärt, como demonstração da influência dos modos renascentistas nas obras de Anton Webern e Arvo Pärt.
Webern, que escreveu a sua tese de doutoramento sobre o compositor flamengo Heinrich Isaac, encontra-se nos seus motetes “o cantochão moldado na polifonia, criando uma unidade perfeita – um exemplo da arte mais elevada”.
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