Jessica Chastain quer romper com a cultura do silêncio que reina numa indústria de Hollywood "insalubre" e dar voz às vítimas de agressões sexuais, após a avalanche de acusações, principalmente contra os produtores Harvey Weinstein e Brett Ratner.
"Não fico confortável com o silêncio", afirmou à AFP aquela que detém o papel principal do primeiro filme dirigido por Aaron Sorkin, "Molly's Game", que em Portugal recebeu como título "Jogo da Alta Roda" e estreia a 4 de janeiro.
"Se estamos numa indústria tóxica, somos parte do problema e a nossa inação significa cumplicidade", acrescentou a estrela ruiva de 40 anos.
"É importante para mim usar qualquer plataforma à disposição para amplificar a voz daqueles que arriscam tudo para salvar outras pessoas", assegura, sobre as mais de 100 mulheres que decidiram denunciar os assédios, agressões sexuais ou violações cometidos por Harvey Weinstein e outros poderosos da Sétima Arte.
Entre elas estão várias estrelas, como Angelina Jolie, Gwyneth Paltrow e Léa Seydoux, mas também muitas anónimas da indústria do cinema e fora dela.
"Tenho muitos amigas que foram maltratadas, abusadas", diz ela, numa entrevista por ocasião da estreia de "Jogo de Alta Roda", onde interpreta uma antiga campeã de esqui que se torna rainha do póquer, papel que lhe pode valer uma posição na corrida aos Óscares.
Uma das suas mais recentes mensagens nas redes sociais sobre o caso que agita Hollywood provocou mais polémica, uma vez que se dirige ao produtor de um dos seus próximos filmes, "X-Men: Dark Phoenix".
"Não vamos esquecer", ela escreveu, fazendo a ligação para um artigo sobre as acusações de abuso sexual cometido por Bryan Singer, um dos coprodutores de "X-Men", contra um menor de idade.
Singer tem sido alvo de várias denúncias semelhantes nos últimos anos, todas abandonadas ou arquivadas.
Um representante de Bryan Singer disse à AFP que toda a acusação "sem provas é imprudente e escandalosa".
Jessica Chastain, que alterna filmes independentes como "Um Ano Muito Violento" (2014) e grandes produções como "Perdido em Marte" (2015), justificou sua presença em "X-Men" afirmando que Singer não participou nas filmagens e garantiu que não sabia que ele era co-produtor até recentemente.
Como mudar as coisas
"Acredito que as pessoas deveriam prestar atenção [para saber] com quem trabalham", acrescentou.
Com voz suave mas determinada, a atriz, revelada em "A Árvore da Vida", de Terrence Malick, onde interpretou a esposa de um pai violento, relata que se tornou feminista ao crescer e ser criada por uma mãe solteira.
"Vi-a a lutar para que nós tivéssemos sempre alguma coisa para comer e vi as injustiças à sua volta", recordou.
Jessica Chastain também tomou consciência da discriminação contra as mulheres no início dos seus estudos na prestigiada escola de artes Julliard de Nova Iorque.
"Havia dois terços de homens e um terço de mulheres nas salas de aula. Perguntei a um professor: 'Por que não é 50/50?' e ele disse-me 'Há mais papéis para homens do que para mulheres', ao que respondi 'Como vamos mudar as coisas se não mudarmos essa mentalidade?", lembrou.
Para a atriz, que acabou de trabalhar com o canadiano Xavier Dolan, não é a indústria cinematográfica que está em questão, mas o sistema patriarcal como um todo.
"Vemos abuso de poder em qualquer setor da nossa sociedade onde há um grupo demográfico responsável pelo sustento dos outros. Na política, em Wall Street, nos media e em Hollywood. Devemos esforçar-nos e lutar por mais diversidade em posições de poder", argumenta.
Idris Elba, que interpreta o seu advogado em "Jogo da Alta Roda", acredita que o chamado "teste do sofá em Hollywood", eufemismo para a troca de favores sexuais, "é conhecido há muito tempo".
A estrela britânica de 45 anos conclui que depois "das coisas horríveis que descobrimos sobre o que alguns atores passaram, a boa notícia é que vamos ganhar uma indústria mais saudável e transparente".
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