“Jalan Jalan” é uma reunião de textos filosóficos, poéticos e pensamentos sobre a sociedade, acompanhados por fotografias do autor, que pretende ser uma etapa de descoberta, mais do que uma viagem física pelo mundo, segundo a editora, Companhia das Letras.
Das viagens que fez, Afonso Cruz trouxe a beleza das paisagens, dos campos de arroz, do verde omnipresente, dos templos hindus ou dos macacos zangados, mas trouxe também o título do livro, “Jalan Jalan”.
“Apesar da beleza da paisagem, uma das melhores coisas que trouxe de Bali foi uma oferta do João [um amigo local], que me embrulhou e ofereceu uma palavra, talvez duas: Jalan significa rua em indonésio, disse-me. Também significa andar. Jalan jalan, a repetição da palavra, que muitas vezes forma o plural, significa, neste caso, passear. Passear é andar duas vezes”, explicou à Lusa o escritor.
Para Afonso Cruz, passear não tem como objetivo chegar a um destino e não se mede pela distância nem pela técnica de caminhar, mas “pelo modo como a paisagem nos comoveu ou como o voo de um pássaro nos tocou”.
“Jalan Jalan” está cheio de episódios que de alguma maneira tocaram o escritor, por vezes pela violência, outras pela delicadeza e outras ainda porque se revelaram inusitadas ou iluminadoras.
Entre os episódios mais marcantes, Afonso Cruz conta o de um índio que ofereceu um queijo de ovelha de Évora à amante, a possibilidade de umas orações poderem ter casado dois hindus de castas diferentes, uma tempestade de pirilampos na Bolívia, tragédias que resultaram de extremismos ou conversas com vendedores de tapetes na Anatólia.
“É um livro que anda à volta das coisas, sejam territoriais, ideias ou objetos. Essa viagem circular é importantíssima, pois é ela que permite observar o mundo de todos os ângulos possíveis ou concebíveis. Ao chegar ao lugar oposto de onde nos encontramos ou dando somente um passo para o lado, encontramos um novo ângulo do mundo, que pode mudar radicalmente a nossa experiência interior ou sensorial”, explicou.
Mas o ponto de partida para escrever “Jalan Jalan” está a montante, está nos livros que leu, que o impeliram a viajar para conhecer pessoalmente os lugares retratados, e de onde trouxe histórias, experiências e impressões, que verteu num novo livro.
Esta é uma experiência que resulta “circular”, como a descreve o autor.
“Comecei a viajar por causa dos livros. E, claro, houve viagens que me fizeram ler. O ‘Jalan Jalan’ também é um círculo, não só porque faz dialogar a viagem física com a leitura, como também tem como fio condutor essa reciprocidade que resulta da circularidade das viagens”, afirmou.
Só que as experiências das suas viagens nem sempre corresponderam às expectativas que criara a partir do que lera.
“A leitura do mundo é em tudo semelhante à leitura de um livro: depende do leitor. A cultura dos autores é também uma lente de distorção. A profundidade de uma experiência qualquer terá sempre a profundidade do próprio fruidor”, considera Afonso Cruz.
Para sustentar a ideia, socorre-se de uma frase de Espinoza: “Se um triângulo falasse, descreveria Deus como um ser essencialmente triangular”.
Várias vezes premiado, Afonso Cruz é, além de escritor, ilustrador, cineasta e músico da banda The Soaked Lamb.
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