Depois de oito anos com o espectáculo "Olá!", o ator José Cruz tem uma nova criação "En construction" ("Em construção") que estreou no final do ano passado, em Paris, e que vai ser levado, em março e abril, a várias cidades francesas como Bégles Bordeaux, Simple, Saint Quentin e Perpignan.
"O 'Olá!' demorou oito anos a ser aperfeiçoado e sabia que o próximo seria uma construção. Eu próprio também ainda não acabei de me construir e é disso que trata este espectáculo. Faz também ressonância com as pessoas que trabalham nas obras, essa ocupação tão ligada aos portugueses aqui em França, e é uma homenagem ao meu pai", disse o ator luso-descendente, em entrevista à agência Lusa.
Nascido em França e filho de pais portugueses, José Cruz estudou teatro na École Claude Mathieu, em Paris.
Começou a sua carreira no teatro clássico, mas a vontade de criar os seus textos rapidamente o levou para as produções próprias. Quando a comédia passou a dominar o que escrevia, partiu para o seu primeiro espétaculo a solo, "Olá!".
José Cruz rejeita o rótulo de 'standup' e define o seu estilo de espétaculo como "One Man Show", em que, com humor, oscilando entre as suas experiências pessoais de quem vive entre duas culturas e uma personagem criada para o palco, vai partilhando episódios da vida quotidiana, assim como os seus sonhos e aspirações. Mas não deixa de lado os preconceitos que existem em relação às suas origens.
"As pessoas fazem piadas sobre os portugueses, os portugueses não fazem muitas piadas sobre os outros porque não queremos fazer barulho aqui em França, não queremos ser o centro das atenções. Mas eu queria, e a melhor maneira de se lutar contra os preconceitos é de se apropriar das piadas", afirmou o ator, que diz que a sua plateia é composta 60% por franceses e 40% por portugueses e luso-descendentes.
Para o artista, a associação óbvia que de que os portugueses trabalham nas obras e limpam as casas em França tem uma razão de ser, "porque eram os primeiros trabalhos que os portugueses podiam fazer quando chegavam a França sem saber falar a língua", algo que, na sua opinião, a comunidade não deve esquecer.
"Esta é uma realidade que temos de aceitar e, se não falarmos disso, as próximas gerações vão esquecer de onde vêm e podemos acabar como os descendentes de polacos ou italianos aqui em França, que ainda têm o nome da sua origem, mas já não têm nenhuma ligação a esses países. E, infelizmente, são essas pessoas que hoje fazem parte de partidos como o Rassemblement National", insistiu o ator, mostrando-se preocupado com a dominância da extrema-direita nas comunidades de imigrantes em França.
Assumindo-se como "fratuguês", José Cruz tinha deixado a língua portuguesa de lado no início da sua carreira, mas foi o seu primeiro espétaculo "Olá!" que o levou a recuperar contacto com a língua de Camões, depois de um convite para uma digressão em Portugal. "Em 2010, recebo um telefonema de Lisboa a perguntar se quero ir fazer o meu espectáculo a Portugal, mas em português. Aceitei o desafio e tive três meses para me preparar", contou.
José Cruz já está a trabalhar na versão em português de "En construction" e vai apresentá-la pela primeira vez já nos dias 12, 13, 19 e 20 de abril, em Paris.
Em agosto, o ator partirá para uma nova digressão em Portugal, com 11 apresentações de Norte a Sul do país, utilizando a sala de estar das famílias que o vão receber, para mostrar o seu espétaculo. "Fiz o apelo nas redes sociais e recebi logo quase 100 propostas, escolhi 11 e vou visitar essas pessoas", indicou o ator, que pretende realizar um documentário sobre a experiência.
Para 2020, José Cruz lança o seu objetivo mais ambicioso: uma apresentação no reputado teatro Olympia, ainda sem data definitiva. "Já fiz a primeira parte da Dulce Pontes no Olympia e correu muito bem, agora lanço-me a mim próprio este desafio", concluiu.
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