O romance “Meu velho guerrilheiro”, editado pela Gato Bravo, e o conto “Otelo”, ambos apresentados em outubro, são os primeiros dois lançamentos do escritor brasileiro no mercado livreiro português, apesar de Álvaro Filho residir em Portugal, na cidade de Lisboa, há dois anos.
O romance “Meu velho guerrilheiro”, eleito a melhor ficção de 2017 pela Academia Pernambucana de Letras, navega entre o real e a ficção, entre a política e a autobiografia, recuperando memórias afetivas, “às vezes incertas”, do seu passado para “revisitar o atual golpe político no Brasil”, descreve a editora.
Apresentado este mês no festival literário Folio, “Meu velho guerrilheiro” conta a história de um escritor autoexilado no estrangeiro, que regressa à cidade natal de Olinda, a pedido da mãe, para tentar demover o pai da ideia de matar o presidente, que assumiu o poder após o golpe político de 2016.
“A trama dialoga com o período de turbulência política no país e mostra como momentos extremos podem levar as pessoas a tomar atitudes igualmente extremas”, afirma a Gato Bravo, editora homóloga da brasileira Jaguatirica.
O próprio escritor, e jornalista, assumiu, numa entrevista ao jornal “Folha de Pernambuco”, que este é um livro político, “no sentido nobre do termo”.
“Tenho minhas opções políticas que são claras nas minhas redes sociais, pois são tempos difíceis e obscuros, e posicionar-se é um dever em situações assim, extremas”, disse na entrevista, de dia 08 de outubro.
Ativo na rede social Facebook, Álvaro Filho não esconde as suas ideias políticas e escreve que “Meu velho guerrilheiro” é “um livro sobre os sobressaltos da memória, particular e familiar da personagem, e também coletiva, de um país que parece ter esquecido de tempos sombrios recentes e volta a ‘flertar’ perigosamente com eles”.
“Uma história de resistência em favor da memória e da democracia”, acrescenta o autor, que especifica – salvaguardando que é suspeito para falar – que "‘memória’ e ‘política’ são duas palavras-chaves nesta segunda [volta] pós resultado das eleições no Brasil”.
Álvaro Filho considera ainda que “infelizmente, pelo tema que aborda, ‘Meu Velho Guerrilheiro’ segue cada vez mais atual e de alguma forma premonitório”.
O outro lançamento é o conto “Otelo”, inspirado na literatura universal, que resgata o drama do clássico de William Shakespeare aos tempos atuais e aborda as questões da migração, que inquietam o autor.
Este texto compõe a coletânea dos contos vencedores do “Novos Talentos Escrita FNAC 2018” e conta a história de um jornalista veterano que acorda num hospital com lapsos de memória.
Da médica que o atende ao suspeito de um assassinato, o enredo desenrola-se sob um clima de paranoia provocado pela presença, nem sempre física, deste “outro” que o migrante representa.
Álvaro Filho conta, na sua página do Facebook que, perante o desafio proposto pelo concurso de adaptar uma obra clássica num conto, e sendo sua “intenção” falar da “paranoia do discurso sobre os emigrantes”, pareceu-lhe que “‘Otelo’, pelos motivos óbvios, caiu como uma luva”.
Na tragédia de Shakespeare, Otelo é um general mouro ao serviço do reino de Veneza, que casa às escondidas com Desdemona, uma rapariga de pele clara e filha de um senador rico, uma história que, entre outros temas, aborda o racismo.
Álvaro Filho resume a sua adaptação de “Otelo” como “uma reflexão deste escritor imigrante sobre o discurso paranoico no debate da imigração da Europa”.
Nascido no Recife, no Brasil, Álvaro Filho tem 45 anos e vive em Lisboa desde 2016, onde estuda, trabalha e escreve.
Autor de sete livros, entre eles encontram-se o policial negro “Jornalismo para iniciantes” e a primeira ‘social-novel’ do Brasil, “O diário de viagem do Sr.A”.
Em 2016, venceu o Prémio Pernambuco de Literatura, com o romance “Curso de Escrita de Romance – nível 2”, que é agora finalista do Prémio Oceanos 2018.
A Gato Bravo, responsável pela publicação de “Meu velho guerrilheiro” em Portugal, é uma editora independente recente, que abriu portas no dia 7 de novembro de 2017.
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