No sábado à noite, o Coliseu do Porto, e dia 19, o de Lisboa, vão receber o concerto comemorativo do 30.º aniversário dos GNR (Grupo Novo Rock), baseado no novo álbum “Voos Domésticos”.
No palco estará um Rui Reininho que se orgulha bastante “de, até hoje, ter vivido de e para” a música.
E a banda sonora dos últimos 30 anos bem que poderia começar com o enérgico “Portugal na CEE” e acabar com um mais recatado “Voos Domésticos”, porque se, como reconhece Rui Reininho, “o sistema é o mesmo, o do capitalismo selvagem”, os bombistas da sua altura “estão tão doentes” e faltam “pessoas que sejam presas pela sua coragem e não pelos seus desfalques”.
Mesmo reconhecendo que “se o dever de todo o revolucionário é fazer a revolução”, Reininho nem sempre a tem feito, porque fica “preguiçoso e também inebriado por outras coisas”.
O que não o impediu de, nas suas palavras, ter agora “a imagem de um tipo que insulta as instituições”. Tudo por causa de um gesto que afirma “ter sido tirado fora de contexto” e que foi publicado na revista da Câmara do Porto.
Para o músico, foi esse “fait-divers” que terá estado no recuo da intenção da Universidade do Porto em fazer um concerto com a banda, levando os GNR a abandonar a ideia de comemorar os 30 anos com uma série de concertos “em 30 noites e em 30 bares”.
“Era comemorar de uma maneira mais sincera, mas isso exigia mupi e licenças e eu não estou para andar a meter requisições”, afirmou Reininho.
Se alguém se incomoda com o estilo de aristocrata provocatório deste portuense, forjado, no “convívio da Baixa e no Porto dos ingleses e dos alemães”, pouco se importa e contrapõe com uma história:
“No outro dia, uma amiga telefonou-me emocionada a dizer que tinha chegado à janela e o sino da igreja dos Clérigos estava a tocar ‘Uma pronúncia do Norte’. ‘Vieram-me as lágrimas ao olhos’, disse ela. Ora, muito melhor que qualquer recompensa, ou medalha, ou condecorações, é a cidade ter adotado a música como hino ou a coisa ser tocada no estádio do Dragão”.
“É bom fingir, de alguma maneira, que se pertence a esta mole humana”, afirma Reininho, que até hoje “nunca militou em nada” a não ser nesse gosto de pertencer a uma cidade de onde “sempre saíram ideias” que perfilha como, no passado, a iniciativa de acabar com a pena de morte e da escravatura.
E como era a cidade há 30 anos quando começaram os GNR? “Lá em baixo (Lisboa) inventava-se o Bairro Alto e aqui começavam a haver umas iniciativas engraçadas, os concertos da Cruz Vermelha, o Luís Armastrondo, o grande João Loureiro que organizava e reorganizava…”, diz Reininho, que recorda que “havia um intervencionismo engraçado”.
O primeiro concerto dos GNR com Reininho foi no Rock Rendez-Vous, em Lisboa, e o Porto assistiria depois, no Infante Sagres, a uma primeira parte de Tom Robinson.
Na altura, até pensava que o cinema era se calhar o seu destino, mas “o fluxo GNR” foi mais forte, “foi como um vortex”.
Hoje, olhando para trás, sem medo das crises – “já passei tantas passas e tanto Algarve que a mim não me assustam nada”- vive satisfeito por fazer parte do “filme de tanta gente”.
“Como daquelas duas miúdas que andavam fugidas de casa por Espanha, e queriam levá-las para a prostituição. Elas contavam que choravam e só ouviam uma cassete dos GNR. E pensavam num regresso para casa”.
@Lusa com fotos de José Coelho (agência Lusa)
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