A pós-produção de "Michael", o filme sobre a vida e carreira de Michael Jackson, está num caos após os gestores do património do rei do Pop terem ignorado um detalhe decisivo no contrato com uma das crianças que o acusou de abusos sexuais.
Em novembro do ano passado, foi anunciado que a estreia do filme produzido com o apoio oficial da família passaria de 18 de abril para 2 de outubro de 2025, o que foi interpretado como um sinal da confiança do estúdio Lionsgate no potencial para a temporada dos prémios.
Mas segundo a bem reputada publicação Puck (acesso pago, mas disponível em arquivo), o adiamento foi a resposta a um imperativo: a equipa está numa corrida contra o tempo para refazer a história e chamar a equipa quase um ano depois do fim da rodagem para refilmagens que permitam salvar a super produção com um orçamento de 150 milhões de dólares.
Realizado por Antoine Fuqua ("Dia de Treino"), a grande curiosidade do filme é que o artista falecido em 2009 é interpretado pelo seu próprio sobrinho Jaafar Jackson, a fazer a estreia como ator. O nomeado aos Óscares Colman Domingo e Nia Long são os pais e no elenco ainda se destaca o nome de Miles Teller ("Top Gun: Maverick").
O produtor é Graham King ("Bohemian Rhapsody") e prometeu em várias entrevistas que as acusações de abusos sexuais e pedofilia não iam ficar de fora da história.
Foi isso que aconteceu: segundo o artigo "A Dark Secret Has Imperiled the New Michael Jackson Movie" ["Um segredo obscuro colocou em perigo o novo filme de Michael Jackson"], o dispositivo de enquadramento no início de "Michael" e todo o terceiro ator passam pela controvérsia de 1993 que envolveu Michael Jackson e Jordan Chandler, que tinha 13 anos da altura e o acusou de abusos, com cenas que dramatizam a extensa investigação policial, incluindo um exame íntimo ao seu corpo que o terá deixado traumatizado para sempre.
Segundo o jornalista Matthew Belloni, que leu uma versão perto da definitiva do argumento, o filme dedica muito esforço a provar que o cantor é inocente, apresentando-o como uma vítima ingénua da gananciosa família Chandler, cujas alegações o obrigam a suportar a perseguição e humilhação públicas antes de se chegar a um acordo de indemnização de 20 milhões de dólares.
Só que uma das alíneas do acordo proíbe qualquer dramatização dos Chandler e da sua história, algo que os herdeiros do património de Michael Jackson ignoraram quando fizeram a revisão do argumento escrito por John Logan ("Gladiador", "O Aviador").
Resultado: todo o dispositivo dramático e várias cenas essenciais não podem ser usadas. O filme perdeu a 'espinha dorsal', o que potencialmente obriga a equipa a refazer tudo.
Segundo três fontes envolvidas com a produção, John Branca, um dos executores do património de Michael Jackson, que esteve envolvido na sua vida durante vários períodos entre o final dos anos 1980 e 1990 (interpretado por Miles Teller), garantiu à equipa que não havia mais nada sobre o artista que não fosse do conhecimento público, nenhuma surpresa que colocasse o filme ou a narrativa em risco.
Mas uma investigação publicada no jornal Financial Times em setembro de 2024 revelou que Branca fez pagamentos secretos a cinco pessoas que alegaram ser vítimas após a exibição do documentário da HBO "Leaving Neverland" e os gestores do património avançaram com uma ação de arbitragem contra uma delas, que terá violado o acordo quando estava quase concluído para pedir mais dinheiro.
A equipa do filme e os estúdios envolvidos só souberam pelo jornal e não gostaram de ser apanhados de surpresa, perguntando-se o que mais não teria sido revelado pelos gestores do património. Foi por essa altura que Branca terá avisado que havia um problema jurídico com o terceiro e decisivo ato do filme: não podiam 'dramatizar' o caso dos Chandler.
Segundo o Puck, há várias semanas que o produtor, realizador e argumentista andam à volta do que o poderá substituir e devem apresentar um argumento revisto e um plano de rodagem para aprovação por estes dias. A Universal Pictures, que tem os direitos de distribuição internacional, também terá de aprovar ou abandonar o projeto.
Os custos adicionais das refilmagens, que serão elevados, serão suportados pelo património de Michael Jackson, que já tinha aceite fazê-lo antes de surgir o problema.
King, que não quis falar para o artigo de Matthew Belloni, estará confiante que a sua equipa consegue reparar o estrago e reservou estúdios para março e informou o elenco principal e a equipa técnica. A Lionsgate partilha o otimismo.
A boa notícia, segundo todas as pessoas com quem o jornalista falou, é que as cenas que podem ser usadas são 'impressionantes', o sobrinho de Michael Jackson cumpre e as sequências musicais têm grande impacto.
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