O álbum "Lio canta Caymmi" sai no dia 30, pela editora belga Crammed Discs, e nele Lio interpreta canções do brasileiro Dorival Caymmi, numa parceria com o músico belga Jacques Duvall, amigo de longa data que a incentivou a voltar a estúdio.
É o décimo álbum de Lio, mas o primeiro em que canta integralmente em português, ainda que com sotaque brasileiro e pronúncia francesa, e com o qual retoma uma carreira artística que teve fulgor sobretudo no começo dos anos 1980, ainda adolescente.
Lio, que vive em Bruxelas desde a infância, contou em entrevista à agência Lusa que este é um "disco muito melancólico". "Deve ser os 50 anos. Uma pessoa fica abanada com o que já se passou e se fez de errado, e com o pouco que nos resta para apurar tudo".
Lio é Vanda Tavares de Vasconcelos, portuguesa nascida em 1962, em Mangualde, que emigrou para a Bélgica com a mãe e se tornou uma cantora pop de sucesso aos 16 anos a cantar temas como "Le banana split" e "Les amoureux solitaires". É irmã da cantora e atriz belga Helena Noguerra.
Os anos 1980 foram, aliás, os de maior sucesso para a cantora, com vários êxitos em França, quatro álbuns editados, dezenas de atuações, colaborações dispersas, uma delas com Étienne Daho. Fez publicidade e cinema, trabalhando com Chantal Akerman e Claude Lelouch.
Diz que faz parte de uma geração "que mandou o chuto em muita coisa, com muita vontade e pouca consciência" e que, quando começou a cantar se viva o espírito punk, "toda a gente podia tentar e fazer o que quisesse".
"Sou de uma geração com muito pouca coluna vertebral, a geração pós-68, e isso deu em pessoas muito cínicas, muito egoístas, egocêntricas. Ninguém definia nada, do que é liberdade. Depois é o caos total", recordou.
A carreira teve altos e baixos, porque se quis dedicar sobretudo aos seis filhos, e todas opções artísticas foram tomadas a pensar na sobrevivência da família.
"Às vezes pergunto-me a mim própria como é que eu tive 20 milhões de discos vendidos, tanta coisa na minha mão e consegui fazer nada com aquilo. Mas não faz mal, é a vida. Escolhi ser mãe muitas vezes, um pouco à toa, porque pensava que tinha uma força imensa e que se calhar nunca ia envelhecer. Aos 16 anos uma pessoa pensa que tudo é para sempre", admitiu.
Hoje, com 55 anos, diz que procura ter tempo.
"A minha vida foi pouco tranquila e eu quero tranquilidade, tomar o tempo numa sociedade que está a apressar toda a gente. Tudo tem de ser cada vez mais rápido, a impaciência está por todo o lado e nós perdemos o essencial, porque o essencial pede tempo. É uma posição artística, política e social", afirmou.
O álbum "Lio canta Caymmi" sai este mês, mas a cantora tenciona partir para uma digressão só no final do ano pela Europa e Japão.
"O nome da Lio é grande. Já não atinjo o grande público, mas 20 milhões de discos marcam a indústria. Mesmo que seja um nicho, existe isso. Eu consigo em muitas cidades da Europa encher salas de 400 ou 500 pessoas, basta trabalhar corretamente. Fiz isso quando cantei [o poeta Jacques] Prévert. Fiz 280 concertos. Fiz mais de 200 mil pessoas", recordou.
Diz que tem mágoa de envelhecer, mas é uma mágoa fugaz. "Nunca me trocaria pela rapariga que eu fui aos 16 anos. Não vou trocar o que eu aprendi pelo que eu não sabia”.
Atualmente ainda vive em Bruxelas, por causa dos filhos, mas tenciona regressar um dia para Portugal, onde ainda tem família.
"Quero voltar para aqui, porque é o que eu sinto, é uma questão de ritmo. Ainda não enfrentei a burocracia portuguesa, porque parece que é uma experiência total. Eu sinto-me bem em Portugal, gosto do povo português e da ligação que ainda tem à terra", afirmou.
"Lio canta Caymmi" foi antecipado pelo single "É doce morrer no mar", cujo vídeo oficial foi gravado na praia da Adraga, em Sintra.
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