Em entrevista à Lusa, o guitarrista de 44 anos, natural de Oeiras, contou porque não tenciona regressar a Portugal, as condições que encontrou na capital francesa e como se consegue viver com o ‘fado’ como cartão de visita profissional.
Filho de pai português e mãe francesa, mudou-se para Paris com 10 anos, por vontade materna, mas a infância em Portugal deixou marcas que a adolescência francesa aproveitou para fazer uma fusão entre as duas culturas, abrindo um caminho “natural” para o fado, depois de aprender a tocar viola, aos 15 anos, de forma “autodidata”.
“Não ouvia muito fado, mas comecei rapidamente a tocar outros estilos de música com os amigos que tinha aqui em Paris. Passei do rock ao blues, ao jazz, jazz manouche, e houve uma altura em que toquei muito com argentinos (tango e folclore argentino). Entretanto tinha comprado uma guitarra portuguesa e tocando com argentinos. O tango levou-me diretamente ao fado”, referiu o guitarrista de 44 anos.
Explicou que a naturalidade do fado veio do conhecimento das “melodias do inconsciente coletivo português”, não tendo encontrado dificuldades para se “inserir num estilo musical que não era estranho, ao contrário das outras músicas em culturas” que lhe eram “estrangeiras”, tendo chegado a estudar, em Lisboa, com Carlos Gonçalves, acompanhante de Amália Rodrigues.
“Fora do fado como acompanhante, participei em muitos projetos com a guitarra portuguesa. Paris é uma cidade extremamente cosmopolita, é um ninho culturas. Tenho a sorte de poder encontrar aqui todo o tipo de música e músicos de culturas diferentes, e profissionais de grande nível. Sou aqui conhecido pela guitarra portuguesa e tenho regularmente convite para participar como músico convidado em projetos muito diferentes”, explicou sobre o seu trabalho.
Apesar de ser mais conhecido em França do que em Portugal, o licenciado em musicologia não faz “distinções” entre públicos, porque, na sua ótica, “quando se tenta oferecer o melhor possível, o público aceita” e recebe-o com “carinho em qualquer parte do mundo”, e não equaciona um regresso a terras lusitanas.
Além de carreira, Filipe de Sousa construiu em França uma família com uma mulher francesa e duas filhas, de 15 e 20 anos. Apesar de acreditar que seria possível viver da música em Portugal “para quem toca guitarra portuguesa”, admitiu que as condições em França para os “trabalhadores do espetáculo são muito melhores, sem comparação”, beneficiando do estatuto de “intermitente do espetáculo” há mais de 20 anos.
Esse estatuto impõe ao músico trabalhar, no mínimo, 43 dias por ano, auferindo ao mesmo tempo de um salário regular e beneficiando do resto dos dias para trabalhar nos seus projetos.
Sobre o futuro, um regresso a Portugal não entra nas contas do músico português, que lançou recentemente o trabalho "HYDROLISE (fado framenté et guitare désarticulée)", no qual toca sozinho “ou com convidado, a guitarra portuguesa ligada a ‘loopers’ e efeitos", e também o projeto “Fado Clandestino”, com a vocalista francesa Lizzie Leveé e o guitarrista português Nuno Estevens.
“Vou continuando a tocar música, não só fado, mas sim guardando o espírito aberto a outras culturas, continuando a partilhar ideias e experiências com pessoas que me possam trazer coisas novas”, afirmou.
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