Alguma imprensa chama-lhe o "Diamante Bruto" de "Industry", comparando a jornada desenfreada da personagem de Adam Sandler por Nova Iorque, no filme dos irmãos Safdie, ao episódio que acompanha o dia obsessivo vivido por Rishi Ramdani em Londres, na série disponível na Max.
"White Mischief", quarto capítulo da terceira temporada do drama financeiro, estreado a 2 de setembro, tem sido dos mais elogiados de uma aposta que parece ter ganhado novo fôlego este verão (a entrada em cena de Kit Harington ajudou), destacando-se nos lugares cimeiros das mais vistas da plataforma de streaming depois de duas épocas demasiado discretas.
Discrição foi também uma das características de Sagar Radia até aqui. Embora presente nesta criação de Konrad Kay e Mickey Down desde os primeiros tempos, o ator que encarna Rishi foi sempre uma figura secundária, ainda que a segunda temporada lhe tenha dado mais palco. Mas nunca tanto como o que conseguiu em "White Mischief", episódio-chave do qual é protagonista.
"Acho que a viagem do Rishi da primeira para a terceira temporada é uma viagem que tenho estado a viver com o público. Estou a descobrir quem ele é e o que é, de temporada para temporada, tal como os espectadores têm feito", diz o britânico de ascendência sul-asiática ao SAPO Mag numa mesa-redonda por videoconferência.
"Penso que o Rishi, na primeira temporada, tem um papel muito funcional neste mundo, e está lá como uma personagem e uma energia neste mundo. Os recém-licenciados chegam e estão a experimentar e a ter uma noção de que este é o mundo cruel das finanças e que este é um tipo que representa isso em poucas palavras. Para mim, passar da primeira para a segunda temporada, em que aprofundamos um pouco mais na relação do Rishi com a Harper [Stern, interpretada por Myha'la Herrold], tanto dentro como fora do escritório, foi mais uma vez tentar descobrir quem é ele. O que é que sabemos sobre o Rishi? O que é que ainda estou a descobrir sobre o Rishi? Quem é ele? Na verdade, eu não sabia. E lembro-me de ter tido algumas conversas com o Mickey e o Konrad sobre isso", recorda o ator que já passou por séries como "The Good Karma Hospital" ou "Lucky Man".
"O que é que sentimos em relação ao Rishi? Na terceira temporada, a coisa muda de figura e vemos realmente o mundo do Rishi, dentro e fora do escritório. E ler onde isso o leva foi fascinante. Uma coisa que tenho a dizer é que, no final da primeira temporada, estava a falar com um amigo e ele perguntou-me para onde gostaria de ver o Rishi ir. E eu disse-lhe: 'Não sei. Sinto que ele tem uma personalidade aditiva. Sinto que há aí um ângulo para explorar o vício do jogo, talvez'. E, na verdade, foi fascinante porque eu não tive essa conversa com o Mickey e o Konrad. Guardei-a para mim. Era apenas algo que estava a contar a um amigo", lembra ainda.
Mas a sua intuição revelou-se certeira na fase mais recente de "Industry". "Depois passámos para a terceira temporada e explorámos algumas destas questões e problemas que ele está a atravessar e que se assemelham muito a essa forma de pensar, o que é muito reconfortante. Posso não saber, mas pelo menos estou no caminho certo para chegar onde penso que este tipo está. Talvez, até certo ponto, tenha manifestado isso porque o Mickey e o Konrad também estão a observar-nos e a desenvolver as suas criações com base na forma como estamos a habitar as suas personagens. Portanto, é um ciclo de dois sentidos", observa.
"De certa forma, este episódio representa a série"
Nunca perdendo Rishi de vista, "White Mischief" é dos melhores exemplos da experimentação narrativa de uma série que tem saltitado de forma hábil entre arcos, tensões e personagens. E raramente o terá feito de forma tão concentrada como neste episódio.
"Lembro-me de quando li o guião", conta Sagar Radia. "As pessoas estavam a falar e lembro-me que eu e o Ken [Leung] tivemos uma conversa rápida e o Ken disse: 'É como um filme'. E isso ficou-me na memória. E pensei, 'Uau, sabes que mais? É uma forma muito boa de ver as coisas. Se nos permitirmos concentrar-nos no que é este episódio, qual é a história que estamos a tentar contar do início ao fim deste episódio e quase o tratarmos como um filme, então os fatores externos dos outros episódios têm de ter um papel importante, sim, porque há um fio condutor ao longo da temporada, mas isso permite-nos concentrar-nos completamente na história que estamos a tentar contar nesses 50, 60 minutos. O que quer que acabe por ser. E foi. Foi mesmo", explica.
"Sinto que, de certa forma, este episódio representa a série. É como pegar nas lutas de uma empresa e transformá-las. As lutas de uma pessoa com todo o seu caos e todos os seus riscos e viver no limite, no fio da navalha, assumindo riscos no dia a dia. E também está escrito como um belo arco que reflete a estrutura dos filmes", compara.
Entre várias sequências que revelam facetas até aqui inexploradas de Rishi, tão contraditórias como as de outras personagens da série, o ator destaca uma. "Há uma cena no quarto episódio em que ela e a sua mulher Diana estão a discutir na cozinha. É uma cena muito carregada de emoções. Há muita coisa em jogo. Há muita coisa que veio antes desta conversa. Há muita coisa que está para vir depois desta conversa. Há algumas verdades nisso, naquele momento na cozinha que eu acho que dá ao Rishi um choque de realidade. Há uma frase que a Diana diz. Julgo que é do género 'É muito mais fácil criar rapazes fortes do que homens quebrados. E eu lembro-me que foi um momento tão 'Uff'. Foi um momento e tanto, e lembro-me de ter sentido isso", aponta.
"Foi uma cena difícil de filmar por várias razões. A questão da carga emocional... Também não tivemos muito tempo para a filmar. Por isso, tentámos encontrar verdade emocional num curto espaço de tempo."
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