"As pequenas gavetas do amor" é o sucessor de "Amores Imperfeitos" (2005) e "Viviane" (2007), discos que deram início ao percurso a solo da ex-vocalista dos Entre Aspas. Pelo caminho, Viviane participou também no álbum da Rua da Saudade, em 2009, onde homenageou Ary dos Santos ao lado de Mafalda Arnauth, Susana Félix e Luanda Cozetti.

O novo disco continua a tendência que os anteriores já denunciavam, afastando-se das linguagens pop-rock para se aproximar dos universos do fado, do tango ou da chanson. "Há um certo dramatismo que é comum a estes três elementos. Todos falam do amor com letras maiúsculas e esse é um tema inesgotável e eterno. Há um fio condutor até porque todos estes estilos fazem parte de mim, não surgem do nada", explica.

De resto, alguns destes géneros convivem com a cantora desde a infância. "Nasci em França e cresci lá a ouvir muita música francesa - Édith Piaf, Juliette Gréco e outros cantautores que marcaram uma época. E aí o acordeão estava muito presente, como está neste disco", sublinha.

Além da chanson e da musette, "As pequenas gavetas do amor"passa pela música daAmérica Latina. "Tinha um avô que andou pela Argentina. Descobri alguns dos seus vinis com tangos e achei que era interessante explorar um bocadinho essa sonoridade".

Não se assumindo como fadista, Viviane inclui, ainda assim, alguns traços do fado nestas canções: "Sou portuguesa acima de tudo e acho que todos temos um bocadinho de fado dentro de nós. O que vou buscar ao fado é a profundidade da alma, dos sentimentos. O que deixaria de parte no fado é a questão da fatalidade e do destino. Esse aspecto não me interessa muito, prefiro a parte do seu carácter e personalidade."

Quem também se aproxima do universo fadista é Luís Varatojo, d'A Naifa, cuja guitarra portuguesa condimenta "As pequenas gavetas do amor". Ou António Zambujo e Custódio Castelo, outros convidados do disco. Nas letras, o leque é mais ecléctico, já que Viviane escolheu poemas de José Luís Peixoto, Vasco Graça Moura, Ana Harthely, Eugénio de Andrade, Fernando Pessoa e Rosa Alice Branco, e o disco contém ainda canções assinadas pela própria.

Um ponto final nos Entre Aspas

Antes dos álbuns a solo, Viviane começou por chegar aos ouvidos de muitos com os Entre Aspas, banda que ajudou a criar em 1990. E através de canções como "Perfume", "Criatura da Noite", "Tropecei nas Escadas" ou "Uma Flor", a sua voz tornou-se numa das mais emblemáticas da pop nacional da década. Contudo, a certa altura, houve necessidade de experimentar outros territórios e a banda terminou o seu percurso em 2005.

"Quando decidimos colocar um ponto final foi porque todos tínhamos os nossos projectos. Foi um ciclo que se fechou porque estava a começar outro. Esta vontade de fazer o que faço hoje talvez já estivesse presente nos últimos anos dos Entre Aspas mas a banda tinha uma filosofia, uma linha estética muito própria. Eu não podia impor-lhe este tipo de mudanças", recorda.

Apesar do final dos Entre Aspas, a sua ex-vocalista não esqueceu as canções do grupo algarvio. O seu quinto disco, "www.entreaspasaovivo.com" (2001), ainda é dos que ouve regularmente. "Terminámos com um best of acústico gravado ao vivo e esse último disco dá-me muito gozo. Talvez tivesse sido o princípio da minha paixão pelo acústico. Com esse formato mudámos a roupagem dos temas, acho que ficaram muito diferentes e muito interessantes. Foi uma boa forma de encerrar o capítulo dos Entre Aspas", conta.

Agora, depois da edição de "As pequenas gavetas do amor", os episódios do capítulo de Viviane a solo podem acompanhar-se nos palcos. A cantora apresenta o álbum esta noite no Gloria Live Music Club, na Rua do Ferragial, em Lisboa, e amanhã no Teatro Lethes, em Faro. Dia 18 a sua mistura de fado, tango e chanson pode ouvir-se ao vivo no Centro de Artes de Ovar.

@Gonçalo Sá