O espetáculo foi a analogia musical de uns “Encontros Imediatos de Terceiro Grau”. Durante os primeiros temas, a banda evocava a imagem de um grupo de alienígenas em missão de estudo no planeta Terra, com uma presença distante, refletida em poses teatrais e olhares perdidos no infinito – como se sobrevoasse acima das nossas cabeças indecisas sobre a melhor aproximação – para, aos poucos, ir reduzindo distâncias, estacionar a nave em segunda fila e promover o diálogo e a cooperação entre povos de galáxias afastadas por milhões de quilómetros.

Em palco, os The Antlers dinamitam de forma brutal as canções de estúdio: os arranjos – sobretudo os teclados – surgem tresloucados, as guitarras ganham o poder de arranhar como um gato selvagem, a bateria tem o poder de um sino que anuncia o toque de finados e a voz, essa, entra em nós como um grito, uma ópera em estado indie que nos afaga e revolve a alma.

A primeira aparição do disco voador deu pelo nome de “Parenthesis”, um blues espacial que poderia servir de fundo musical a uma invasão alienígena de grande escala, pintado com guitarras ruidosas e teclados que rugiam numa língua codificada.

“Now Widows” é uma surf trip domingueira numa cratera lunar com ondas suspensas infinitamente pelo dom da gravidade.

“I Don´t Want Love” abre com um kick de bateria e arranca com teclados que parecem querer invocar o lado negro da força.

“Frech Exit” poderia bem ser a Riviera Inglesa dos Metronomy, se, para além de miúdas giras e de corpinho bem feito, houvesse lugar para alguma sujidade.

Em “Atrophy”, abençoados pelo psicadelismo das luzes que piscam como relâmpagos, somos convidados a entrar num manicómio durante um acesso de loucura geral, um motim concertado à moda de “Voando Sobre um Ninho de Cucos” – mas para maiores de 18 anos.

“Rolled Together” soa a delírio westerniano, a música perfeita para a cena do duelo final de “O Bom, O Mau e o Vilão”, se alguém se decidisse por fazer uma versão moderna deste épico (esperamos que não o façam, o original é perfeito).

“Every Night My Teeth Are Falling Out” traz-nos um travo a música pop do início dos 90, num disco que roda no prato com algumas rotações a mais.

“Bear” começa por soar como um slow de final de noite num clube recreativo para, num piscar de olhos, se transformar em hino pop de um verão que (apenas) há muito pouco nos fugiu dos corações.

“Hounds” é uma ópera cantada a duas vozes, uma pequena maravilha que poderia estar uma temporada larga no Teatro São Carlos sem que ninguém se importase.

Depois de uma salva de palmas estrondosa, a banda aproveita para agradecer à British Airways o facto de ter tornado possível este concerto. Parece que o material acabou mesmo por aparecer, dez minutos antes das portas do Lux se terem aberto. Só faltou mesmo a roupa, mas “quem precisa de meias para dar um concerto”? – comenta Peter Silberman. A resposta é dada pelo mestre dos teclados e da componente orgânica Darby Cicci: “É o primeiro concerto em quatro anos em que toco calçado”.

Visivelmente satisfeito – arriscaríamos também emocionado –, Silberman agradeceu o facto de muito boa gente na sala falar inglês e achar piada “às coisas parvas que dizemos”. A empatia era total, queria-se congelar o momento presente para que a noite se estendesse até o sol se pôr.

“Putting The Dog To Sleep” seria a música ideal para que, num baile de finalistas, o rapaz tímido perdesse de vez a vergonha e finalmente decidisse convidar a miúda gira para uma dança corpo a corpo.

Cada um dos acordes de “Corsicana” soa a ópera trágica, capaz de despertar as lágrimas mesmo no ser mais sisudo.

Antes de terminar com “Sylvia” – uma marcha militar de alguém a caminho de um combate pela honra de um amor condenado ao fracasso –, Silberman aproveita a deixa para uma pequena operação de merchandising: “Não costumamos fazer muito isto mas…temos alguns CD´s e T-shirts para vender, mas têm de ir até à nossa carrinha que está estacionada lá fora”. Querem mais indie que isto?

Minutos depois, Peter Silberman, Michael Lerner e Darby Cicci passeavam-se pelo Lux como alienígenas que tinham acabado de conquistar um pequeno planeta alojado nos confins do universo. Tinham razões de sobra para estarem satisfeitos. Afinal, acabavam de dar um dos grandes concertos de 2011. Voltem sempre. E tragam a nave espacial (e a carrinha).

Texto: Pedro Miguel Silva

Fotografias: Joana Cardoso