Não, não vamos falar de óculos, nem de gestos característicos com as mãos, nem de palavrões em forma de convite num refrão… Nada disso.
Afinal há muito mais a dizer do artista português que além de esgotar por duas vezes o Coliseu do Porto, ainda decide dar um espetáculo em matiné para que ninguém fique de fora. É de uma celebração em família que se trata, de uma carreira já longa e repleta de canções que marcaram gerações.
Já lá vão dezoito anos, mas é com Viagens que Pedro Abrunhosa saúda o Porto, e o Coliseu põe-se de pé para o receber num longo aplauso. Bem-vindo a casa, Pedro. Aqui todos o tratam pelo primeiro nome.
Ele seduz o público numa dança lenta de movimentos intensos e simbólicos, não deixando nenhuma palavra passar impune. O que de facto não "É difícil" para Pedro Abrunhosa é embalar tudo e todos na sua voz, e assim continua como um maestro.
"As três célebres palavras que vão tão bem juntas: Boa noite Porto!"- diz. Não esconde a satisfação de voltar à sua cidade, e é com detalhe que tece vários elogios, à cidade mágica.
Faz ainda questão de agradecer por quase não ter de cantar as músicas, uma vez que terá ainda mais dois concertos no dia seguinte. Em tom de brincadeira, acrescenta ainda: "Mas não é por isso que me vão poupar!".
Logo para começar promete um concerto diferente, mais informal e aberto. Não o poderia ter levado mais à letra quando convidou o público a participar num "karaoke avançado" cantando com ele em cima de palco. Obviamente, que no mesmo segundo, várias pessoas atravessaram a correr os corredores do auditório do Coliseu do Porto. Em menos que nada Pontes entre nós era entoada não só pela audiência, mas também por mais de vinte pessoas que agora partilhavam o palco com o seu ídolo.
A celebração continua, mas mesmo em clima de festa, o espírito revolucionário não foi silenciado. “Há canções incontornáveis...” e, por isso mesmo, a carismática Não posso mais não podia deixar de ter o seu lugar. Foi num destes refrões que Pedro Abrunhosa pediu ao público para baterem com o punho esquerdo na palma da mão direita, criando um “som de esmagamento” enquanto ele dizia algumas palavras de ordem.
Foram muitos os momentos de grande emoção durante o espetáculo, mas para além desses, Pedro Abrunhosa ainda decidiu premiar os presentes com momentos de inusual expressão artística, tais como a leitura de uma seleção de contos e a projeção do trabalho fotográfico de Augusto Brázio ao longo da noite.
Não acabando por aí as surpresas ainda interpretou alguns clássicos do panorama nacional e internacional: Purple Rain de Prince, Porque me olhas assim de Fausto e Je T'aime,...Moi Non Plus de Serge Gainsbourg.
As redes sociais não foram esquecidas e durante o concerto foi interpretada uma música escolhida pelos fãs online, o tema Como uma ilha do álbum “Silêncio”.
O concerto foi muito caracterizado pela constante alternância entre as palavras sussurradas e as apoteoses musicais, contanto para isso, com a grande banda que o acompanha, os Comité Caviar.
No entanto, as baladas ocupam um lugar de destaque nas preferências da audiência, que não deixou esconder as emoções ao ouvir Eu Não Sei Quem Te Perdeu. Pedro aproveitou o momento para também chamar a atenção para uma realidade desconcertante: a solidão da terceira idade. Chega mesmo a dizer: “Haverá algo pior do que morrer sozinho?”, ainda acrescenta “Gosto de pensar que algures nesses lares há um rádio ligado e que isso traz alguma companhia... talvez uma melodia”.
Uma noite de muitas emoções, quase terminada pelo tema Ilumina-me. As luzes apagaram-se e toda a multidão presente iluminou o Coliseu com os seus telemóveis. Perante a visão magnânima da imensidão de luzes espalhadas no auditório, Pedro diz que “O maior espetáculo de todos não é em cima do palco, é aí”. Mas esta foi apenas a deixa para o primeiro de dois encores, que levaram o público ainda mais além.
O derradeiro instante prendeu-se no Momento e em Tudo O Que Eu Te Dou, interpretados apenas por Pedro Abrunhosa ao piano.
“Não sei se vai ser possível refletir esta magia, de uma noite encantada para o resto da vida.”- confessa. É ao fim de três horas que dá por encerrada a noite, desta vez pelas palavras de Jorge Sousa Braga: “Esta cidade não é uma cidade é um vício”.
Depois de tudo isto, é caso para dizer... Contado ninguém acredita!
Texto: Íris Rocha
Fotografias: Filipa Oliveira
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