Na bagagem, o MC de Odivelas traz “A Árvore Kriminal”, o seu novo álbum.

Os bilhetes para o concerto custam €8 e estão em venda antecipada nas lojas Montana Shop & Gallery, Flur, Matéria Prima e Louie Louie.

O espetáculo tem início às 22h00.

Sobre Halloween

De certa maneira, o rap são os pés descalços do hip-hop – ou seja, uma parte importantíssima para o equilíbrio dessa cultura maior que abrange diferentes artes de rua. Durante a primeira metade da década de 90, muito antes do hip-hop ficar deslumbrado com os seus ganhos, o rap viveu anos de uma fertilidade feroz e anormal. A riqueza desse período é tal, que, mesmo descontando os manifestos sagrados de Dr. Dre, Notorious B.I.G. ou Wu-Tang Clan, sobra ainda uma segunda linha de álbuns altamente respeitáveis de coletivos como Souls of Mischief, Pharcyde ou Lords of the Underground, entre tantos outros. A luta, que elevou essa geração de mensageiros, terá sido a mesma que obrigou o rap a ser engenhoso para disputar o tempo de antena com a música pop e o rock de Seattle (igualmente fulguroso nessa altura). E tudo isto ocorre num período em que o hip-hop era ainda uma escalada e não a festa de novos ricos em que se transformou hoje.

Allen Halloween entende que o rap genuíno só pode existir num espírito inconformado e é também isso que faz dele um dos mais excecionais alunos da melhor escola de 89-94. Quando, numa entrevista recente, alguém lhe pedia que caracterizasse o seu estilo, Halloween não hesitou em dar a resposta mais simples: “é rap”. Ponto. E essa atitude “sem merdas” revela o essencial sobre um MC que, à custa de muito trabalho e algum génio, conseguiu encontrar vantagens nos limitadíssimos meios técnicos de que dispunha para gravar o seu disco de estreia, “Projecto Mary Witch”. Repare-se, por exemplo, em como nem o facto de algumas programações terem sido feitas numa Playstation (imagine-se) impediu o álbum de garantir um entusiasmado culto e o estatuto de clássico improvável do hip-hop nacional. A verdade é que, mesmo depois de alguns anos passados sobre o seu lançamento, continua a ser difícil explicar o milagre de “Mary Witch” e a sua fórmula única. Muito mais fácil será encontrar os maiores elogios para a sua inventividade lírica, que, num flow imparável, tão depressa refere nomes de jogadores da bola como descreve os hábitos dos “agarrados” e das “miúdas tesudas” dos bairros mais infames de Odivelas (a morada de Halloween e da sua crew Youth Kriminals).

Por entre as noites mal dormidas e as muitas “mocas” de “Mary Witch”, Halloween é o herói trágico, o MC encurralado, a “bruxa” que aniquila rivais com dois versos (venceu todos os beefs até aqui e não se baixou ao nível de outros tantos), um brilhante contador de histórias e o esquizofrénico capaz de assumir os diferentes papéis (e as vozes) das suas óperas de rua. Para confirmar as duas últimas qualidades, escute-se, por exemplo, “Um dia de um dread de 16 anos”, um épico urbano de 10 minutos, tão denunciador, pertinente e elaborado como o “FMI”, de José Mário Branco.

Sara Novais