Apesar de uma agenda de palcos agitada q.b., de uma discografia em nome próprio que começa a consolidar-se e de participações recentes em "Corrente", dos Clã (para o qual assinou um tema), e na compilação "Voz e Guitarra 2" (com uma versão de "Cara Estranho", dos Los Hermanos), Nuno Prata ainda se mantém um segredo demasiado bem guardado - não só quando nos lembramos de outros projetos de antigos elementos dos Ornatos Violeta, mas também face a muitos nomes associados à revitalização do pop-rock em português nos últimos tempos.
Admita-se que o lançamento do terceiro álbum, homónimo, na reta final do ano - quase sempre guardada para listas de balanços e edições natalícias -, também não será a mais favorável para que as novas canções do cantor, compositor e músico portuense tenham o eco merecido. E vale bem a pena dedicar alguma atenção ao sucessor de "Todos os Dias Fossem Estes/Outros" (2006) e "Deve Haver" (2010), novamente a revelar uma voz própria, segura na escrita e nos arranjos.
Gravado a dois, ao lado do multi-instrumentista Nico Tricot, colaborador habitual, numa pequena sala de um andar de escritórios, esta edição de autor (apoiada pela Cultura FNAC e Fundação GDA) mantém o ambiente intimista, talvez até mais do que os antecessores. À semelhança desses, o disco intriga por uma diversidade instrumental que nunca equivale a canções balofas e ostensivas, até porque são sempre comandadas pelas palavras - às vezes sarcásticas, como em "Vai Andando Sobre as Águas", crónica do delírio coletivo pelo falhanço individual e contraste com a vulnerabilidade envolvente de "Simplesmente É Isso", tema que convida Manel Cruz.
Por vezes comparado a Sérgio Godinho ou Chico Buarque, nestas canções Nuno Prata também não anda longe do despojamento dos Feromona ou do sentido de humor dos Clã, nomes mais aproximáveis do que a escola Ornatos. E se talvez possa ser cedo para falarmos de uma escola Nuno Prata, há por aqui sinais de personalidade como a piscadela de olho de "Julgava Estar Resolvido (Inventa Agora um Refrão)" a "Refrão-Canção", um dos grandes momentos do álbum anterior, ambas debruçadas sobre a nobre arte (ou árdua tarefa?) de escrever canções ("Inventa agora um refrão/ É tempo já de o fazer/ Tens o quê para dizer?/ Conclui a dissertação").
Curtos e diretos, quase sempre a rondar os três minutos de duração, estes temas servem pequenas narrativas centradas em episódios mundanos, como o das noites mal dormidas de "A Minha Inveja", com Nuno Prata a convocar um ukulele para remoer frustrações. Mais descontraída, "As Voltas (Fiz Por Me Lembrar de Ti)" dança entre encontros e desencontros em modo acústico e com direito a assobio, reflexões na linha das de "Sentada À Minha Espera", em que os teclados tentam disputar o protagonismo da guitarra.
Embora comece bem, assente num dia desperdiçado em casa, a faceta lânguida de "Hoje É Feriado" não é tão certeira, culpa dos quase seis minutos que saem a perder face à concisão dos outros temas. Nada que o final do alinhamento não compense, graças à fuga para a frente de "Levanta-te e Anda", marcha obstinada e abrilhantada pelo xilofone, sininhos, ganzá ou ovinho. A hesitação entre procrastinar ou tentar a sério passa ainda por "Agora É que É", outra aliança inspirada entre cordas e percussão, com potencial de hino ainda maior caso encontre guarida em algumas rádios. Porque estas canções, apesar de valerem por si, também precisam de amigos.
@Gonçalo Sá
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