O nome nasceu de uma canção dos dEUS, "Jigsaw You", em 1999, mas hoje o projeto de João Rui, Jorri e Susana Ribeiro, à semelhança da banda belga que o inspirou, já pode orgulhar-se de ser alvo de culto dentro e fora portas. Ao longo de um EP e três álbuns, os a Jigsaw partiram da folk, do blues e do rock alternativo e construíram um percurso que os tem levado a estradas portuguesas, europeias e norte-americanas - sejam elas físicas ou virtuais.

Os caminhos mais recentes, contudo, são relativamente próximos e incluíram cidades portuguesas e espanholas, no âmbito da tour ibérica centrada em "Drunken Sailors & Happy Pirates" (2011), o seu terceiro disco, reeditado recentemente. "É um álbum conceptual e o conceito é a construção da identidade, a construção do indivíduo - basicamente, como se chega a ser o que se é. Em termos melódicos, acaba por ser uma continuação do trabalho que temos vindo a fazer, embora talvez menos parecido com uma sonoridade tão folk, mesmo que este ainda seja um álbum folk. Acrescentámos também alguns instrumentos - dos 23 do álbum anterior subimos a parada para 27 neste. E é também o nosso álbum mais negro até à data", aponta João Rui, o vocalista.

Em palco, as canções do disco não deixam de ser negras e herdeiras da folk, mas aceitam mudanças. "Gostamos muito do desafio do palco, de alterar as configurações da música. Quando acreditamos que temos realmente uma boa canção é quando sentimos que há ali um coração de uma música. E quando a música tem esse poder, é uma questão de vesti-lo depois de diversas maneiras... gostamos de o adaptar aos espaços em que tocamos. Um concerto nosso tanto pode ter dois ou três instrumentos como 16 ou 17, dependendo da sala", explica.

Videoclip de "Crow Covered Tree":

Música e imagem

Com canções em que a música e a letra dividem protagonismo, os álbuns dos a Jigsaw são feitos de pequenas narrativas, contam histórias, desenham um imaginário. "Não é só a música em si, a parte melódica, que nos inspira. Para nós, a literatura está no mesmo prisma da parte musical, não há um segundo lugar. Mas há outras artes que nos influenciam, como a pintura ou o cinema", conta João Rui.

Nos últimos tempos, a sétima arte até tem ganho terreno na obra do grupo. "No caso do cinema, sempre nos interessou muito a sua interação com a música. A primeira interação que fizemos foi no festival Caminhos do Cinema Português, quando nos convidaram para um concerto e sugerimos musicar um filme, desafio que fazia mais sentido para nós no contexto de um festival de cinema. Resultou tão bem que nos convidaram no ano seguinte, quando musicámos o «Respirar Debaixo D'Água», do António Ferreira, que repetimos no Wake Up Nimas, este ano. E agora convidámos realizadores de todo o mundo - México, Alemanha, EUA, Espanha ou Portugal, obviamente - para darem vida às 35 canções deste disco através da sua forma de expressão".

Da península para o continente

Depois de terem regressado a Espanha para atuar em Madrid, Gijón ou Vigo, este mês, no âmbito da tour ibérica, nas próximas semanas os a Jigsaw têm datas agendadas em cidades francesas, holandesas, alemãs ou belgas. A conquista do mercado europeu vai sendo feita passo e passo - a banda já tinha atuado na Polónia, Reino Unido, Áustria ou Itália na digressão de 2010 - e teve nos palcos de "nuestros hermanos" uma boa rampa de lançamento. "Esta tournée ibérica vem na sequência do trabalho que andámos a fazer e da excelente receção que tivemos em Espanha, que nos acolheu de braços abertos. A edição do álbum ocorreu logo em Espanha e Portugal em simultâneo. As primeiras apresentações do álbum decorreram em Madrid, Barcelona e depois Lisboa. Atuámos em Sevilha e a casa estava lotada - até ficaram pessoas lá fora", recorda João Rui.

Esta considerável adesão espanhola a uma banda portuguesa que canta em inglês, algo incomum, será a exceção que confirma a regra ou o início de algo que poderá alterá-la? "Julgo que Espanha estará um bocadinho mais aberta à música internacional e à música cantada em inglês, como é o nosso caso. Mesmo aquela ideia que se tem de que os espanhóis são muito barulhentos... até podem ser, mas não nos nossos concertos - e digo isto porque, nos nossos concertos, o silêncio é um elemento indispensável, daí gostarmos tanto de tocar em auditórios".

"Uma banda a seguir" e outros piropos

Elogiados pela «Les Inrockuptibles», bíblia francesa da cultura pop que os considerou uma das bandas a seguir este ano, ou pela holandesa «Heaven Magazine», que os coloca entre os projetos indie, folk e americana mais recomendáveis da europa, os a Jigsaw já começam a habituar-se ao reconhecimento fora de portas. "Agora consigo enquadrar isso, posso ver que tivemos este trabalho todo de nos apresentarmos pela Europa, faz sentido termos agora algum foco sobre nós. Foi mais estranho na altura em que editámos o «Like a Wolf», em 2009, em que nem sequer havia esta ideia de promoção europeia e começámos a receber apoio e foco de media internacionais - da Alemanha, Espanha, Itália, rádios dos EUA - sem termos feito qualquer esforço nesse sentido".
Perguntamos a João Rui o que terá estado na origem desse burburinho inesperado. "Gosto de acreditar que foi mesmo a música", responde-nos o vocalista. Depois da tour ibérica, a música dos a Jigsaw passa então pelo palco do Le Galopin, em Guigamp, França, a 31 de março, antes de se instalar noutras salas europeias ao longo de abril e maio.

@Gonçalo Sá