Samuel (
Gilles Lellouche) é um enfermeiro cuja esposa (
Elena Anaya) é raptada nos últimos estágios da gravidez. para a salvar, ele terá de retirar um gangster chamado Sartet (
Roschdy Zem) que se encontra a convalescer no hospital em que ele trabalha. E isso é o início de uma frenética luta contra o tempo, em que o protagonista se vê no meio de uma guerra entre bandos rivais e polícias, numa corrida vertiginosa para salvar a mulher e não morrer pelo caminho.
«À Queima-Roupa» é a segunda longa-metragem de
Fred Cavayé, que já tinha assinado
«Pour Elle», que teve direito a «remake» em Hollywood, nada menos que
«72 Horas», de
Paul Haggis, protagonizado por
Russell Crowe.
Remakes americanos
Há um estúdio americano que já comprou os direitos para fazer uma versão norte-americana do «À Queima Roupa», tal como já tinha acontecido com o meu filme anterior, o «Pour Elle». E o que é surpreendente para mim é que eu me inspirei muito nos filmes americanos para fazer os meus próprios filmes: que os americanos por sua vez venham ter comigo para refazer aquilo que eu fiz inspirado neles é surpreendente. E é muito elogioso para mim, claro, principalmente no meu primeiro filme, o «Pour Elle». Eu não vinha de parte nenhuma, escrevi o filme sozinho no meu apartamento e um ano e meio depois o Paul Haggis e o Russell Crowe encontraram-se comigo, e o Russel Crowe interpretou o que eu escrevi. É muito bom para o ego.
Uma história universal
Quando escrevi o «À Queima Roupa» com o meu co-argumentista Guillaume Lemans, tentámos sempre escrever sobre situações e sensações muito universais, que não fossem específicas de Paris. Mesmo nos décors, quando rodo em Paris nunca há coisas tipicamente parisienses, tudo poderia existir em outros locais do mundo ou noutras cidades francesas. Eu tento criar um sistema em que todo o público se possa identificar de forma perfeita. Os meus filmes funcionam se o meu público se envolver completamente. Se nos identificarmos muito com o herói, então passaremos por tudo o que ele passa. Os meus filmes são filmes sobre o prazer do espectador em saber se os personagens chegarão ou não ao seu objectivo e na viagem que fazemos com eles.
Atores de talento
O Gilles Lellouche é um excelente ator, um dos melhores da sua geração em França, com quem eu tinha muita vontade de trabalhar. Ele tem aquele talento de fazer com que os homens queiram ser os seus melhores amigos e as raparigas queiram ser algo que mais que as suas melhores amigas. Ele é encantador e muito masculino. O boom de popularidade que ele teve não foi acidental, ele tem muito talento. O Roschdy Zem também tem um grande carisma, as mulheres acham-no muito sexy. A personagem dele quase não fala, é muito animal, e ele é um excelente ator porque consegue transmitir tudo o que tem de transmitir com as duas ou três frases que tem no filme.
A inspiração a Alain Delon
A personagem do Rochsdy Zem chama-se Sartet, que era o nome que a personagem do Alain Delon tinha no
«Clã dos Sicilianos», Roger Sartet. Como a personagem se inspirava na dele, usei esse nome durante a escrita do argumento só como ferramenta, só que depois achei que fazia sentido assumir a referência direta. Então escrevi uma carta ao Delon a pedir autorização para usar o nome e uns dias depois ele telefonou-me a aceitar. E isso para mim foi extraordinário, eu cresci a ver os filmes dele e fui muito influenciado por eles. E o cinema permite estas ligações, permite tocarmos nos nossos ídolos de infância. Eu também mostrei o filme ao Jean-Paul Belmondo, só comigo e com ele na sala, e eu adoro este meio por causa disso, porque eu serei toda a vida aquele miúdo que via filmes na televisão em criança e que queria estar perto daquelas estrelas.
Filmes à americana, orçamentos à europeia
Eu tenho uma fração do iorçamento dos americanos para fazer um filme de ação mas o meu trabalho também é esconder esse facto. O espetador quer lá saber se eu tinha cinco euros ou um milhão para fazer o filme, o que ele quer é que o divirtam. E por isso é preciso ter astúcia, porque muitas vezes a falta de meios obriga-nos a ser mais inteligentes. Quando faço uma perseguição, faço-a a pé e no metro e não com 150 carros, porque não tenho meios de fazer isso. E é preciso fazer tudo muito rápido, na sequência do metro disseram-me que eu tinha cinco dias para usar aquelas instalações. E eu pensei «bom, isso vai ser difícil, é pouquíssimo», e depois eu percebi que eram cinco dias de quatro horas, da uma às cinco da manhã, e que não podia esticar um minuto sequer. Era preciso ser rápido e inventivo.
Atores no hospital
Eu exigi tanto ao Gilles e aos outros atores que eles terminaram todos no hospital. É verdade. Claro que não sou totalmente inconsciente, não lhes pedi para colocar a vida em risco, mas a verdade é que para que o espectador se envolva foi preciso filmar os atores a fazerem as cenas arriscadas. O Gilles só usou duplos uma vez no filme, numa cena que o seguro não permitiu que fosse ele a fazer, que tinha um salto entre dois prédios. Mas há uma cena em que eu o pendurei a uma altura de cinco andares e isso ele fez.
As reações desencontradas da crítica
É muito interessante ver a diferença de recepção crítica nos EUA e em França. Nos EUA, os críticos foram muitíssimo elogiosos, todos disseram «aí está um filme que reinventa o thriller norte-americano», e em França o filme foi considerado regular. Talvez porque nos EUA o meu filme seja visto como exótico e se tenha o direito de gostar dele, enquanto em França ele não tenha nada de exótico e seja visto como um filme popular e menos chique. E é curioso para minm ver como a objectividade se altera quando se vê um mesmo filme consoante o sítio em que se está. No «New York Times», o Roger Ebert deu-lhe uma pagina inteira, o Robert McKee, grande guru dos argumentos cinematográficos, disse que o argumento do «À Queima Roupa» era exemplar, que era o melhor «thriller» dos últimos anos, e em França disseram que a acção era bem feita mas que o argumento era nulo.
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