Oriundos de bandas como os
Ornatos Violeta, os
Pluto e os
Foge Foge Bandido, chegam-nos os camaleónicos
Zelig. A banda formada em 2006 editou recentemente o seu primeiro álbum, “Joyce Alive!”, sendo que o registo é praticamente todo ele instrumental. A primeira apresentação do disco decorreu na passada quinta-feira, 17 de Junho, na loja FNAC do Norte-shopping, onde o Palco Principal falou com os membros da banda, Peixe e Serginho. Quem passava pela loja não ficava indiferente ao som e à performance destes “mutantes” musicais.
Zelig pretendem marcar a diferença com um novo estilo nunca antes feito em Portugal.
Palco Principal - Já sei que o vosso nome foi inspirado no Leonard Zelig, personagem de Woody Allen. Por que razão vos inspirou esta personagem?
Peixe – O nome foi escolhido, acima de tudo, por causa da forma como soa. Gosto do som da palavra. Gosto muito da obra do Woody Allen, gosto de quase todos os seus filmes, especialmente “
Zelig”, que é um dos meus favoritos. A nossa música tem uma influência muito forte de muitos géneros diferentes. É uma música que se transfigura muito e passa por muitas mutações. O personagem...
Seginho - ...tem uma doença.
Peixe – hum... Não é bem uma doença.
S – Mas é uma espécie de doença e ele é a única pessoa que sofre dela. Ele tem um género de um sistema de autodefesa, que o transforma psicologicamente e também fisicamente, de modo a que fique igual às pessoas que o rodeiam. Cresce-lhe o cabelo, fica gordo e funde-se sempre com as pessoas para não ser distinguido.
P - Basicamente é isso, é o homem camaleão. É uma pessoa que tem a particularidade de ficar parecido com quem está próximo dele.
PP – A vossa música também actua dessa maneira?
P – Precisamente. O filme, acho eu, que é uma metáfora da influência que as coisas exercem umas sobre as outras. É um bocado surreal e cómico ao estilo do Woody Allen. A nossa música acaba por ser, também, um pouco de tudo. Por exemplo, o Serginho toca numa banda de música contemporânea, mas conhece os álbuns dos Pantera. O Nico fez o conservatório de flauta transversal, mas foi baterista de uma banda punk hardcore. Daí acaba por haver aqui uma confluência de géneros completamente diferentes e de influências diferentes.
PP - Como é que foi a vossa escalada até conseguirem lançar o vosso primeiro álbum?
P – Comecei com o Edu que é baixista e já tinha tocado comigo numa banda que eu tinha, os
Plutos, onde participava o Manel Cruz dos
Ornatos Violeta, banda à qual também já pertenci. Entretanto, fiz um disco com uma banda de jazz onde conheci o Eduardo. Depois, com o Eduardo, o Manel Cruz e o Ruka formámos os
Pluto. A partir daí comecei a fazer muitas sessões apenas com o Eduardo e pensei que tinha de construir um projecto novo. Um ano após termos começado a trabalhar juntos decidimos convidar o Serginho, o Nico e o Marrucho para adaptar as nossas ideias a um quinteto, mas isto já foi há quatro anos. Eu conheci o Serginho na ESMAE, onde estive a estudar, o Marrucho estava no curso de jazz. O Nico, conheci-o já no tempo dos Ornatos, na época fizemos alguns concertos em França. Conhecemos uma banda que era os Mosquito Stings, onde o Nico tocava. Por obra do destino, ele veio viver para Portugal e conividei-o também para os
Zelig.
PP - O facto de alguns de vocês já terem pertencido a bandas como os Ornatos Violeta e os Foge Foge Bandido, ajudou-vos a criar este álbum?
P – Os
Foge Foge Bandido já são posteriores aos
Zelig. De qualquer das formas, sim. Ajudou sobretudo a experiência, até porque este disco dos
Zelig é uma edição de autor distribuído pela Universal e lançado pela editora independente, Turbina, que também editou o álbum dos
Foge Foge Bandido. Na realidade é quase uma edição de autor, porque se trata de uma editora muito pequenina, mas que serve precisamente para os músicos poderem editar sem estarem dependentes das editoras multinacionais, que nunca arriscam num projecto da mesma natureza que o nosso, que não é nada comercial.
PP - Nas vossas músicas vocês misturam estilos diferente como o jazz e o rock. Qual é o género musical que mais vos define?
S – Nunca pensámos muito em nomes, mas quando fizemos o myspace tivemos que pôr lá o nome de três estilos. Pusemos alternativo, experimental e soundtrack music.
P – Costumam dizer que a nossa música é muito cinematográfica. Mas não temos esse objectivo. Quando me perguntam que género de música é que fazemos, eu nunca sei explicar. Digo que é uma mistura de várias coisas.
PP – No entanto, vocês já fizeram a banda sonora para uma curta-metragem do Miguel Clara Vasconcelos. Não tencionam voltar a fazê-lo, caso surja oportunidade?
P – Sim. Ainda há pouco tempo fomos contactados por um estudante de cinema que é português, mas que está a estudar em São Paulo, no Brasil. Contactou-nos também no sentido de fazer a banda sonora de uma curta metragem. É algo que, pelo menos a mim, alicia-me. As poucas experiências que tive de fazer música para filmes foram muito boas. É muito trabalhoso e difícil, mas também é muito gratificante.
PP – As vossas músicas acabam por contar uma história através do som...
P – Sim. Penso que sim.
PP – Para criar as vossas canções, inpiram-se em alguns filmes?
P – Não. A única coisa que é inspirada num filme é o nome da banda.
PP – Então, como surgem as histórias que transcrevem para as músicas?
P – As histórias e as narrativas das músicas que estão implicitas no álbum são um bocado abstractas. Não há nada muito conceptual ou uma ideia muito forte por trás dessa narrativa. É algo aleatório, mas também muito instintivo. As pessoas dizem que as músicas são muito cinematográficas, porque transmitem imagens, emoções. Enquanto estávamos a trabalhar na primeira música do disco eu lembráva-me um bocado daquelas fugas do James Bond e das preseguições de carros. A primeira música [Sopro da Morte] foi inspirada nessa ideia, mas de uma maneira muito geral.
PP – A vossa digressão pelas lojas FNAC começou quando?
P – Começou hoje. Este foi o nosso primeiro espectáculo. Vamos estar, no próximo Sábado, em Coimbra, Domingo em Leiria e no Domingo seguinte em Lisboa, no Chiado.
PP – Qual foi a vossa impressão desta primeira actuação?
P – Eu gostei. Correu bem. Estes espaços são um pouco frios, apesar de dentro da loja ser o espaço mais acolhedor, mas não é propriamente um auditório. Acho que foi fixe, mas sinceramente uma loja de disco não é o espaço onde nos dá mais gozo tocar. Espero começar a tocar em auditórios e coisas assim desse género.
PP – E palcos maiores?
P – Isso também. E festivais de rock, de jazz, de world music, de música experimental, de música alternativa, festivais de música minimal, podemos ir a todos.
PP – Mas têm intenção de tentar actuar nesses palcos?
P - Claro. A ideia é precisamente tentar que a nossa música seja uma mais-valia para irmos a todos os sítios, isto pelo facto de ser tudo e nada.
PP – O que significa o nome do vosso álbum “Joyce Alive!”?
S –
Joyce é uma expressão que pegou muito. Fui eu que comecei a usá-la.
Joyce é um sinónimo de fixe.
P – Quando as músicas soavam bem nós dizíamos que eram “Joyce Alive”.
S – Também não tínhamos mais nenhum nome para dar ao disco. Ainda tentámos pensar em mais algum nome, mas não surgiu nenhum e acabou por ficar “Joyce Alive!”. Foi uma expressão que nos marcou. Era uma espécie de
private joke.
PP – Na vossa opinião, quais são as músicas deste álbum que o público vai gostar mais?
P – Não faço a mínima ideia. Há umas músicas menos estranhas do que outras, mas não sei.
S – A mãe do Marrucho fez uma lista em que pontuava as músicas do álbum de 0 a 20, e ordenou-as pelo seu gosto.
P – E qual é a primeira?
S – É a
Despedida. Mas não deu 20 a nenhuma, porque tal como ela disse esta é uma nota que se aplica apenas às ciências exactas e a nossa arte é uma cena subjectiva. Mas as músicas tiveram pontuações entre 16 e 19.
P – Então, segundo a mãe do Marruxo, a
Despedida será aquela que a maior parte das pessoas vão gostar.
PP – Acham que a vossa banda vai conseguir vingar no mercado musical, uma vez que é algo completamente novo em Portugal?
P – Espero que sim. Acima de tudo é algo que é diferente, mas não o é gratuitamente. Nós trabalhámos imenso neste disco, por isso temos a consciência tranquila. Não é um projecto feito só para ser estranho.
PP – Acham que o facto de ser diferente também vos pode ajudar?
P – Sim, pelo menos é um projecto com personalidade.
PP - O que gostariam que o futuro reservasse ao Zelig?
P – Concertos e mais discos.
PP – Querem mais joyce?
P – Sim, mais
joyce. Fazer com que o
joyce cresça e o próximo disco seja melhor do que este e que possamos tocar mais, dar mais concertos e levar a nossa música a mais pessoas. Tocar fora do país era uma das coisas que gostava muito de fazer. Lá fora, também pode haver mercado para este género musical.
PP – Acham que, fora de Portugal, a receptividade pode ser maior?
P – Sim, provavelmente, porque isto é um estilo de música alternativo. Em toda a Europa, apesar de continuar a ser alternativa, o nicho é maior. Aqui em Portugal, esse nicho é muito pequeno. Seria fixe conseguir tocar fora do nosso país, até porque trata-se de música instrumental, logo não há a barreira da língua. Acima de tudo, o mais importante é continuarmos a fazer música e a divertirmo-nos com isso. Não esperamos que o futuro nos reserve páginas sobre a nossa glória na história. A nossa glória é sobretudo estarmos na sala de ensaios a tocar. Isso é que nos dá gozo.
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