
Damiano David, conhecido como a voz e a energia dos Måneskin (vencedores do Festival Eurovisão da Canção de 2021, ao representarem Itália), estreou-se este sábado, dia 21 de junho, a solo em Portugal, com um concerto no MEO Kalorama. No Parque da Bela Vista, em Lisboa, o cantor foi recebido por uma pequena multidão que celebrou o disco de estreia do italiano.
Depois de conquistar palcos globais com a sua banda abraça agora uma sonoridade distinta, mais próxima da pop e das baladas, afastando-se do rock e dos riffs enérgicos. Nas novas canções, abre o coração e expõe vulnerabilidades, explorando o amor e a identidade.
No concerto em Lisboa, que arrancou um pouco antes das duas da manhã, Damiano David apresentou o disco “Funny Little Fears”, editado em maio. Apesar da hora tardia, os fãs receberam um dos nomes mais sonantes da quarta edição do festival com energia no auge e mostraram ter a letra de todas as canções na ponta da língua.
O italiano apresentou um alinhamento que contou com quase todos os sucessos do seu disco de estreia – de fora ficou, por exemplo, “Next Summer”. O concerto arrancou com “The First Time”, “Voices” e “Tango”, convidando o público a entrar num novo mundo musical.
“Desculpem, não falo nada de português, mas devia. A única coisa que sei é ‘o mar de gente, o Sol diferente, o monte de betão. Não me provoca nada’”, disse o artista, recordando o tema “Deslocado”, dos NAPA. “Devia ter vencido o Festival da Eurovisão... depois de Itália, claro”, ressalvou.
Sempre com adrenalina em palco e muitos “obrigados” pelo meio, o alinhamento seguiu com “Mars” e “Zombie Lady”, temas que foram cantados a uma só voz pelos fãs, antes de o artista avançar para uma versão de “Nothing Breaks Like a Heart”, de Mark Ronson.
“Fiz rock durante 10 anos”, lembrou, confessando que tem sido criticado por agora se aventurar por outras sonoridades. Em resposta a todos os comentários negativos, Damiano trouxe uma versão de “Too Sweet”, de Hozier.
A reta final do concerto reforçou o registo emocional do cantor, com faixas como “Angel”, “Tangerine” e “Born With a Broken Heart”.
“Não termino nenhum concerto sem tirar a camisola”, disse, trocando a sua T-shirt branca por uma camisola da seleção nacional de futebol e recriando o “sim” de Cristiano Ronaldo.
Para a despedida, Damiano David escolheu uma balada, “Solitude”, deixando os fãs com água na boca – apesar da entrega total do artista e da sua banda, os 45 minutos do concerto souberam a pouco, limitação agravada pelo horário já invulgarmente tardio do arranque. Talvez tenha sido apenas um aperitivo para um regresso?
No MEO Kalorama, o italiano provou que está a construir, com autenticidade, uma sólida carreira a solo – e deverá ser esse o caminho a seguir nos próximos tempos, deixando os Måneskin em pausa... por muito que custe a alguns admiradores.
Uma noite (demasiado) tranquila com Jorja Smith
Noutro dos concertos mais esperados do último dia do MEO Kalorama, Jorja Smith subiu ao palco principal pouco depois das 23h00. No Parque da Bela Vista, a artista — uma das vozes mais reconhecidas do novo R&B britânico — trouxe todos os grandes sucessos da sua carreira, mas não conseguiu aquecer o público.
Canções como “Blue Lights”, “Teenage Fantasy” e “Addicted” pontuaram os momentos mais fortes do alinhamento, mas foi apenas com “Be Honest” que os espectadores despertaram soltaram a voz.
"Este concerto devia ter sido ao pôr do sol", desabafou alguém entre canções — como quem tentava justificar a aparente falta de ligação entre público e artista.
No MEO Kalorama, Jorja Smith ofereceu um espetáculo sem grandes surpresas, calmo para não dizer morno — os êxitos estavam lá, a voz também, a banda cumpriu, mas era legítimo esperar mais.
A certeza de Daniel Avery e a surpresa de Jasmine.4.T
Calmaria não foi, no entanto, um dos elementos da atuação de Daniel Avery no palco Panorama Lisboa. Arrancando quando o concerto de Jorja Smith ainda decorria no Palco MEO, o produtor e DJ britânico revelado no impactante "Drone Logic" (álbum de estreia editado em 2013) era dos nomes mais apetecíveis do espaço do MEO Kalorama apontado para a pista de dança. E não desiludiu, num set em modo rave a céu aberto pela noite dentro, com som robusto e acompanhamento visual à medida.
Ao longo de duas horas, teve sempre um público fiel e efusivo - e nem alguma debandada a meio (provavelmente, para o concerto de Damiano David) comprometeu muito a moldura humana. Curiosamente, parte do público não era sequer nascido durante a década de 1990, período que tem impacto mais notório nas música de Avery - feita de techno devedor de referências como os conterrâneos Orbital ou Underworld. Numa viagem quase sempre instrumental (as exceções foram clássicos de Tiga e Nine Inch Nails já no fim), alternou sonoridades duras e oníricas acolhidas com gritos e aplausos recorrentes. E, claro, com muita dança, obrigatória num recinto com bolas de espelho nas árvores.

O último dia do MEO Kalorama 2025 também se fez com a música de Jasmine.4.T, revelação indie britânica que apresentou as canções de "You Are the Morning", o seu primeiro álbum (editado este ano). A britânica cujo percurso já se cruzou com Lucy Dacus (para quem abriu concertos) e Jukien Baker (convidada de uma das suas canções) arrancou no Palco MEO com folk lânguida e serena mas acabou com rock agreste (e promissor), banda sonora de quem ia chegando ao recinto ao final da tarde. Pelo meio, destacou-se entre as vozes mais politizadas e contestatárias do festival sem perder a candura. Na mira esteve o governo israelita, mas também o norte-americano, em particular pela tentativa de silenciamento das pessoas trans da administração de Trump.
Noga Erez, BadBadNotGood, Royel Otis e Branko foram outros nomes que atuaram no Parque da Bela Vista na despedida da quarta edição do MEO Kalorama. Tal como nos dias anteriores, o número de espectadores não foi divulgado pela organização do evento, embora o recinto estivesse muito longe de repleto no concerto de Damiano David. A hora tardia da atuação não terá ajudado, à semelhança do que aconteceu nos concertos de Flaming Lips e FKA Twigs na quinta e na sexta-feira, respetivamente - ambos com menos público do que espetáculos apresentados mais cedo nesses dias.
Uma questão a repensar na próxima edição (já confirmada, em agosto de 2026), sobretudo quando os concertos de alguns cabeças de cartaz tiveram início depois de o serviço de metro deixar de estar disponível - e embora haja autocarros gratuitos à saída do Parque da Bela Vista facultados pela organização, o percurso abrange uma área relativamente limitada.
No que à música propriamente dita diz respeito, o cartaz do MEO Kalorama 2025 contou com atuações recomendáveis ao longo dos três dias (particularmente no segundo, mérito da ótima programação do Palco San Miguel). As dos Scissor Sisters, Pet Shop Boys, Damiano David (apesar da brevidade) ou FKA Twigs foram daquelas que merecem ser guardadas com especial estima na história do festival.
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