As segundas-feiras não são fáceis. Que o digam os norte-americanos House of Lords, que terminaram a “Big Money Tour” na capital, ontem à noite. Um público demasiado morno e distante (estamos a entrar em depressão coletiva?) e uma série de azares técnicos que, à vez, bateram à porta de cada um dos músicos, retiraram algum do brilhoà segunda passagem dos Lords pela Musicbox. Nada de grave, no entanto.A sala do Cais do Sodré esteve composta, sem encher, mas, quem esteve, não deu o tempo por mal empregue.
A banda de James Christian foi uma das mais marcantes do hard rock do final dos anos 80/ início dos 90, um verdadeiro supergrupo, recheado de estrelas e rodeado das melhores equipas de composição, produção e management. Das primeiras formações, resta Christian que, depois de uma reunião mal-sucedida em 2005, decidiu manter o projeto, com novos músicos.
O concerto passou em revista as várias fases de uma carreira longa mas, ao contrário do que os saudosistas poderiam estar à espera, apostou mais, ainda assim, nos tempos recentes desta segunda encarnação dos House of Lords (e já vão quatro) do que nos grandes clássicos da época dourada em que a banda, apadrinhada por Gene Simmons dos Kiss, enchia as emissões da MTV. Não faltaram, no entanto, temas como o incontornável "Sahara" do álbum homónimo de 1990, a quem coube, mais uma vez, a honra de abrir a noite. Falsa partida - o baixo estava mudo e o tema só durou até meio. Solucionado o problema, foi “I Don’t Want to Wait All Night”, do álbum “Come to my Kingdom”, que arrancou, definitivamente, com o espectáculo.
James Christian, recuperado de um cancro na próstata que obrigou ao adiamento da digressão, inicialmente prevista para o último trimestre de 2011, demonstrou toda a classe de muitos anos de experiência e a voz rouca e inconfundível, daquelas que aparece uma vez em cada dez mil. Em ritmo de rock dançável, com toda a melodia e o peso que os HOL sempre conseguiram conjugar tão bem, o alinhamento seguiu com “Big Money”, tema título do novo trabalho, lançado em setembro do ano passado… mas não sem um problema com a bateria obrigar a mais uma paragem.
“Purgatorio Overture n.2 + Come to My Kingdom” e “S.O.S. in America” continuaram na senda dos álbuns mais recentes e, além dos dotes sobejamente conhecidos de Christian, deram oportunidade ao público português para contactar com as qualidades do guitarrista Jimmi Bell, do baterista Bj Zampa e, em especial, do jovem baixista Chris McCarvill, que não esteve em Lisboa, em 2008. Ao longo da noite, cada um teve oportunidade de brilhar a solo e percebe-se que Christian está bem acompanhado com esta banda. No disco, o guitarrista sueco Tommy Denander e Rob Marcello, guitarrista dos Danger Danger, também participaram na composição e gravaram algumas linhas de guitarra, entre outros convidados.
“Love Don’t Lie” protagonizou um dos momentos mais românticos da noite, entoado em coro pelo público. A balada, um original de Stan Bush, foi o primeiro grande sucesso dos House of Lords, inserido no álbum de estreia, em 1988, e agradou, em especial, ao público com mais alguns anitos, que veio carregado de recordações e de muitos CDs e vinis para assinar. Os clássicos só regressariam na reta final do concerto.
Entretanto, a noite continuou com “Cartesian Dreams”, “Blood”, “I’m Free”, “These Are the Times” e “Rock Bottom”. Metal melódico, hard rock pomposo, stadium rock… todos estes epítetos foram usados, ao longo dos anos, para descrever o som dos House of Lords, sem que qualquer deles consiga transmitir esta sonoridade única. Há uma dignidade clássica, um sentimento épico subjacente aos HOL, que parece incongruente porque, ao mesmo tempo, está lá uma sensualidade tipicamente rock’n roll e um sabor sulista que nos remete para a América dos pioneiros, deserta e melancólica. O nome sempre lhes assentou que nem uma luva. Sem chegarmos ao parlamento inglês, estamos na presença de Senhores e cada concerto é uma experiência digna de um lorde.
Tempo, entretanto, para mais um problema técnico, desta vez com a guitarra de Jimmi Bell. Acontece aos melhores e o público português, apesar de estranhamente pouco comunicativo, também soube compreender a maré de azar. Ainda bem, porque, a rematar, chegaram a magnífica “I Wanna Be Loved”, “Pleasure Palace” e “Slip of the Tongue”, mais três temas extraídos do primeiro álbum da banda.
Uma saída rápida para o backstage, e o regresso previsível para o encore com "One Foot in the Dark", do álbum "Come to My Kingdom". Era esperado, talvez, um tema mais emblemático para o final, mas estava dado o ponto final do concerto e da intensa digressão europeia.
Os autógrafos, fotografias, beijinhos e contactos da praxe com os fãs foram mais do que generosos. Depois de meio apático e tímido durante o espetáculo, o público acordou e não se esquivou a uma cerveja e dois dedos de conversa com os ídolos.
James Christian regressa à Europa no outono, mas com outras funções. Casado há largos anos com a rock queen Robin Beck, produziu-lhe, recentemente, um novo álbum, bem como o trabalho que marcou o regresso de outra diva do rock, Fiona Flannagan. Ambas sobem ao palco na próxima edição do Firefest, em Nottingham, e James Christian assegura o baixo e os coros nos dois espetáculos. Para saber mais um pouco sobre toda a atividade de um dos músicos e produtores mais activos do hard rock actual, entrevista no Palco Principal brevemente.
Portugueses Affäire asseguraram a primeira parte
Eram 22h30 quando os Affäire subiram ao palco do Musicbox, com dupla responsabilidade: aquecer as hostes para uma banda da dimensão dos House of Lords e apresentar-se, pela primeira vez, na capital.
O projeto é bastante recente e aposta na sonoridade e visual tipicamente sleaze rock, a roçar já o glam. Mesmo com a consciência de quem acha que não será esta a época mais favorável para o género (o primeiro single chama-se, precisamente, “Born Too Late”) afirmam, com algum orgulho e audácia, ter o objetivo de se apresentarem internacionalmente como a primeira banda do género em Portugal. Uma coisa é certa – se há público no país para este tipo de música, ele estava, maioritariamente, concentrado naquela sala e os Affäire podem congratular-se pela recepção a que tiveram direito. Ao longo de mais de meia-hora, fizeram desfilar oito temas, entre os quais o lado B do single - “Japanese Tease” -, “Devil’s Cross” ou “Blasted”.
Competente, constituída por músicos experientes, devidamente apresentada ao seu público e completamente imbuída do espírito sleaze, a banda da margem sul tem, agora, espaço para amadurecer o projeto e, tanto quanto o género o permite, afastar-se de alguns clichés que permitam, realmente, a entrada no mercado internacional, onde o glam e o sleaze estão a renascer em grande força e a competição será mais renhida.
Setlist House of Lords
1.Sahara
2.I Don't Wanna Wait All Night
3.Big Money
4.Purgatorio Overture
5.Come to My Kingdom
6.S.O.S. in America
7.Love Don't Lie
8.Cartesian Dreams
9.Blood
10.Bass Solo
11.I'm Free
12.These Are the Times
13.Drumagogery (Drum Solo)
14.Rock Bottom
15.I Wanna Be Loved
16.Pleasure Palace
17.Guitar Solo
18.Slip of the Tongue
Encore
19. One Foot In the Dark
Liliana Nascimento
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