Tantas vezes nos acontece chegar a um determinado momento com muitas (demasiadas) expetativas e acabarmos desapontados. Para equilibrar a balança e compensar a dor da desilusão (e se doi...), a vida oferece-nos, por vezes, verdadeiras pérolas escondidas onde menos esperávamos. Geralmente, nas coisas mais simples.
Domingo à noite, pós-futebol e noitadas de fim de semana, pré-Halloween enfiado à segunda-feira... ah, e diz que há uma espécie de gala em homenagemà decadência na televisão. Apesar dos aparentes impedimentos, algumas dezenas de resistentes rumaram à pequena capela da música numa ruela do Cais do Sodré. O senhor que os aguardava merecia mais mas, coerente com as crenças que guiam a sua música e a sua vida, mostrou-se sempre profundamente agradecido e encantado com as demonstrações de carinho do público que, apesar de pouco, soube ser acolhedor e entusiasta.
Dan Reed não pisava território português desde novembro de 1989, altura em que partilhou o palco com os Bon Jovi, em Lisboa, ao serviço dos Dan Reed Network. Dos tempos de glória, em que os discos vendidos ainda se contavam em milhões, os DRN legaram sucessos como “Long Way to Go”, “Ritual” ou o incontornável “Rainbow Child”, que Dan Reed continua a levar na bagagem, mas a sua carreira é, hoje, muito mais do que isso. Cantautor de excelência, transporta para as letras e melodias os ensinamentos, histórias e personagens que conheceu nas suas viagens e nos períodos em que viveu em locais tão díspares como a Índia, as planícies do Dakota do Sul, Jerusalém, a sua Portland natal ou, presentemente, Praga.
Num palco despido e acompanhado apenas da guitarra acústica, Dan Reed fez-nos recordar como a simplicidade pode ser refrescante e magnânime. Desde “She’s Not You” - cerca das 22h30 -até “All My Lovin’” - a terceira música do encore, passava já da meia-noite - o músico contou a história por detrás de cada tema, comunicou com o público, dedicou canções às várias pessoas que teve oportunidade de conhecer antes do espetáculo (quando chegou à Musicbox, fez questão de ir cumprimentar todo o público que já estava nas instalações e esteve um pouco à conversa), emocionou-se e entregou-se por completo.
O álbum “Coming up for Air”, de 2010, dominou o alinhamento do espetáculo, com temas fantásticos como “Losing My Fear”, “On Your Side” ou “Brave New World”. Tal como o ambiente da sala, as canções contidas no álbum apresentam um tom intimista, onde o autor partilha a sua perspetiva sobre o mundo atual e sobre a forma como as pessoas se relacionam entre si, da política à espiritualidade, passando pela família, pela amizade e pelo amor. A mesma busca que o levou a abandonar a indústria da música, em 1993, fê-lo regressar em meados da década passada, depois de experiências tão distintas como a representação, a construção civil ou os retiros espirituais.
Na calha está já um novo CD, com saída prevista para a primavera de 2012, altura em que gostaria de regressar a Portugal com a sua banda para um novo espetáculo. Uma hora e meia passou demasiado depressa, e o que começou com o público timidamente instalado em puffs vermelhos, terminou com uma explosão de emoções e uma ovação de pé que parecia exigir que a noite não acabasse. No final, ninguém se fez rogado a fotografias, autógrafos, dois dedos de conversa e muitas promessas de regresso. Foi simples, foi direto e foi bonito. O mundo devia ser sempre assim.
Setlist
She’s Not You
Cruise Together
Coming up for Air
Rainbow Child
Holy Diver (cover de Dio)
Losing My Fear
Long Way to Go
On Your Side
Lover
Pray for Rain
99 Lashes
Ritual
Get to You
Closer
I’m So Sorry
Brave New World
Salt of Joy
Encore:
Candlelight
Stronger Than Steel
All My Lovin’
Liliana Nascimento
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